quarta-feira, maio 13, 2015

SCHILLER, ROUGEMONT, LIMA BARRETO, RAIMUNDO CORREIA, WONDER, GRAHAM, MURILO MENDES, NELSON PEREIRA & BRAQUE.


VAMOS APRUMAR A CONVERSA? – Tenho me dedicado já há algum tempo aos estudos sobre o papel e responsabilidade dos pais, da família e da sociedade com relação ao desenvolvimento das crianças. Isso desde que escrevi meu primeiro livro para o público infanto-juvenil. Esse foi o momento do meu primeiro estalo: como cuidar, orientar, acompanhar e promover o desenvolvimento adequado na infância. Eu me vi criança e não sabia nada. Meu olhar voltou-se para os meus pais. E como é fácil atirar pedras, vou falar por mim. Fui uma criança convencionalmente feliz e problemática: presepeiro em todos os sentidos. Tagarela, inquieto, inventivo, dentro dos padrões de normalidade da época (muito embora não saiba eu o que seja essa normalidade e até me recuso a aceitá-la; leia-se Caetano Veloso: “De perto ninguém é normal”). Ah, minha mãe, avós, tias, professoras, coitadas – Que o diga Carma! Com certeza, eu seria enquadrado dentro de um perfil patológico desses que são inadvertidamente prescritos nesses tempos dos CIDs e DSMs de hoje. Alcancei a adolescência com as broncas da idade: queria que meus pais fossem outros, mas ao mesmo tempo, falasse mal do meu pai ou da minha mãe, eu brigava – contradições próprias da idade. Tornei-me pai ainda adolescente: uma felicidade para lá de incontida, uma vaidade desproposital não recomendável para ninguém. Quando tomei ciência do que fui como pai, vi que tudo que eu detestava nos meus, era talqualmente revelado em mim com relação aos meus filhos. Ou seja: como diz Belchior na sua canção “Como nossos pais”. Dormir com um barulho deste me fez ter maior dedicação aos estudos tanto na área da Educação, como na área do Direito, do Teatro, da Literatura, da Música e, nos últimos anos, da Psicologia. Usei o meu exemplo de pai e me descobri verdadeiramente irresponsável. Primeiro com a constatação de mero fabricador de filhos (esse tipo incluído entre os Fabos do Fecamepa) e de que o tempo passou e não vi que a criança cresce absorvendo os exemplos dados pelos pais, pela família e pela sociedade. Os erros que eu julgava serem dos meus pais estavam, inconsciente e multiplicadamente, reproduzidos por mim na minha ingênua ilusão de que eu jamais daria a um filho o mesmo tratamento que recebi. Isso era o que eu pensava até o momento em que me vi responsável por tudo que um filho passa pela maneira como os pais, se achando dono da verdade, imprimem, reprimem e deixam colados na personalidade do filho. Acredito que eu tenha dado o primeiro passo: reconheço que ser pai começa quando cai a ficha de que muitos filhos nasceram pela busca irrefreável de desfrutar do prazer de amar e sair copulando a torto e a direito pela necessidade premente de autoafirmação e satisfação plena (e depois a mãe que se vire com a gravidez e o filho), estourando a bomba na catástrofe do remorso, quando terá de dar uma de bombeiro na tragédia, tentando consertar tudo. A responsabilidade de ser pai vai muito mais além do simples bancar educação e sustento, mostrar o que é certo ou errado, e de chegar junto ou com afeto ou censura nas horas que julgamos adequadas. Ser pai é muito mais. E vamos aprumar a conversa! Ah, já ía me esquecendo, um lembrete: hoje é dia da reprise do programa Brincarte do Nitolino pras crianças de todas as idades, com apresentação da Isis Corrêa Naves, de manhã às 10hs e, de tarde, às 15hs, no blog do Projeto MCLAM. Para conferir online é só clicar aqui.

Imagem: Figure double with marine background, do pintor francês Georges Braque (1882-1963)

Curtindo o dvd Stevie Wonder Live at Last (2009), do cantor, compositor e ativista estadunidense de causas humanitárias e sociais Stevie Wonder.

EROS OU O DESEJO SEM FIM – No livro O amor e o Ocidente (Guanabara, 1988) do escritor e ambientalista suíço Denis de Rougemont (1906-1985), trata acerca de temas como o mito de Tristão, Ágape ou o amor cristão, o amor cortês, heresia e poesia, os místicos árabes, o romance bretão, paixão e mística, as místicas ortodoxas e a linguagem da paixão, crepúsculo do amor-paixão, sobre a influencia precisa da literatura nos costumes, a evolução da cavalaria até Cervantes, Romeu e Julieta, Astréia: da mística à Psicologia, Don Juan e Sade, o instinto glorificado, a paixão em todos os domínios, paralelismo das formas, linguagem guerreira do amor, a paixão levada à política, o mito contra o casamento, da anarquia ao eugenismo, sobre a fidelidade, os paradoxos do ocidente, canções de gesta e romances corteses, concepções orientais do amor, Freud e os surrealistas, paixão e ascese, sobre o sadismo, entre outros interessantes assuntos. Da obra destaco o trecho Eros ou o desejo sem fim (Platonismo, druidismo, maniqueísmo): Em Fedro e O Banquete, Platão fala de um furor que vai do corpo à alma para perturbá-la com humores malignos. Não é o amor que ele louva. Mas há outra espécie de furor, ou de delírio, que não se engendra sem a intervenção de alguma divindade, nem se cria na alma a partir de nós mesmos: é uma inspiração inteiramente estranha, uma atração que age externamente, um arrebatamento, um rapto indefinido da razão e do sentido natural. Será chamado, a justo título, entusiasmo, que significa, "endeusamento", pois esse delírio procede da divindade e nos impulsiona para Deus. Tal é o amor platônico: "delírio divino", arrebatamento da alma, loucura e suprema razão. Por conseguinte, o amante está junto do ser amado "como no céu", pois o amor é a vida que ascende por degraus de êxtase para a origem única de tudo o que existe, longe dos corpos e da matéria, longe do que divide e distingue, para além da infelicidade de ser o que se é e de ser dois no próprio amor. Eros é o Desejo total, é a Aspiração luminosa, o impulso religioso original elevado à sua mais alta potência, à extrema exigência de pureza que é extrema exigência de Unidade. Mas a unidade última é a negação do ser atual em sua sofredora multiplicidade. Assim, o impulso supremo do desejo conduz àquilo que é o não-desejo. A dialética de Eros introduz na vida algo totalmente estranho aos ritmos da atração sexual, um desejo que não decresce jamais, que nada mais pode satisfazer, que até mesmo desdenha e foge à tentação de se realizar em nosso mundo, porque só deseja abraçar o Todo. É a superação infinita, a ascensão do homem para o seu deus. E esse movimento é sem retorno. [...]. Veja mais aqui.

RECORDAÇÕES DO ESCRIVÃO ISAÍAS CAMINHA – A obra Recordações do escrivão Isaías Caminha (Ática, 1995), é o primeiro romance do escritor Lima Barreto (1881-1922), narra a história de um jovem provinciano que vai menino para o Rio de Janeiro, pensando em fazer a vida e virar doutor. Contudo, tudo lhe parece impossível, não reage, vende os livros para poder pagar o hotel e o aluguel da casa de cômodos, passando a comer apenas quando não podia suportar a fome, até alcançar a vida de repórter e se transformar num boêmio. Esse romance pré-modernista faz uma crítica ao racismo e ao preconceito, além de satirizar a imprensa de que fazia parte, retratando a realidade social com uma linguagem acessível e clara. Do livro destaco esse trecho: [...] IV - Se os senhores algum dia quiserem encontrar um representante da grande nação brasileira, não o procurem nunca na sua residência. Seja a que hora for, de manhã, ao amanhecer mesmo, à hora do jantar, quando quiserem enfim, se o procurarem, o criado há de dizer‑lhes secamente: Não está. Falo‑lhes de experiência própria, porque, durante as inúmeras vezes, a toda a hora do dia, em que fui ao Hotel Términus procurar o Deputado Castro, apalpando a carta do coronel, tive o desprazer de ouvir estas duas palavras do porteiro indiferente. Nas últimas vezes, antes mesmo de acabar a pergunta, já o homenzinho respondia invariavelmente da mesma desesperada forma negativa. É bem fácil de imaginar com que sorte de cogitações eu ia passando esses dias. O meu dinheiro dentro em breve, pago o hotel, ficaria reduzido a alguns mil‑réis insignificantes. Não conhecia ninguém, não tinha a mínima relação que me pudesse socorrer, dar‑me qualquer coisa, casa ao menos, até que me arranjasse. Saíra de meus penates, cheio de entusiasmo, certo de que aquela carta, mal fosse apresentada, me daria uma situação qualquer. Era essa a minha convicção, dos meus e do próprio coronel. Tinha‑se lá, por aquelas alturas, em grande conta a força do doutor Castro nas decisões dos governantes e a influência do velho fazendeiro sobre o animo do deputado. Não era ele o seu grande eleitor? Não era ele o seu banqueiro para os efeitos eleitorais? E nós, lá na roça, tínhamos quase a convicção de que o verdadeiro deputado era o coronel e o doutor Castro um simples preposto seu. As minhas idas e vindas ao hotel repetiam‑se e não o encontrava. Vinham‑me então os terrores sombrios da falta de dinheiro, da falta absoluta. Voltava para o hotel taciturno, preocupado, cortado de angústias. Sentia‑me só, só naquele grande e imenso formigueiro humano, só, sem parentes, sem amigos, sem conhecidos que uma desgraça pudesse fazer amigos. Os meus únicos amigos eram aquelas notas sujas encardidas; eram elas o meu único apoio; eram elas que me evitavam as humilhações, os sofrimentos, os insultos de toda a sorte; e quando eu trocava uma delas, quando as dava ao condutor do bonde, ao homem do café, era como se perdesse um amigo, era como se me separasse de uma pessoa bem amada... Eu nunca compreendi tanto a avareza como naqueles dias que dei alma ao dinheiro, e o senti tão forte para os elementos da nossa felicidade externa ou interna... A minha ignorância de viver e falta de experiência quase deixavam transparecer a natureza das minhas preocupações. O gerente do hotel pareceu‑me que as farejava. De quando em quando, procurava na conversação amedrontar‑me com o seu poderio, proveniente de estreitas relações que mantinha com as autoridades. Assim entendi ser o sentido das anedotas que contava. Uma vez — narrou ele — depois de uma longa hospedagem, um hóspede quisera furtar‑se ao pagamento. Não tivera dúvidas, fora ao delegado auxiliar, um seu amigo, o doutor Felício, contara‑lhe o caso e o homem teve que pagar, se quis tirar as malas. Com ele, era assim; não dormia. Nada de justiça, de pretorias... Qual! Com a polícia a coisa vai mais depressa, a questão é ter amigos bons e ele tinha‑os excelentes; e, em seguida, interrogando‑me diretamente: O senhor não viu, ontem, aquele homem gordo que jantou na cabeceira? É o escrivão da “X”. Os escrivães, fique o senhor sabendo, é que são as verdadeiras autoridades. Os delegados não fazem senão o que eles querem; tecem os pauzinhos e... E o italiano rematou com um olhar canalha aquela sua informação sobre a onipotência dos escrivães. Foram de imensa angústia esses meus primeiros dias no Rio de Janeiro. Eu era como uma árvore cuja raiz não encontra mais terra em que se apóie e donde tire vida; era como um molusco que perdeu a concha protetora e que se vê a toda a hora esmagado pela menor pressão. Oprimido com sua antevisão de misérias a passar, de humilhações a tragar, o meu espírito deformava tudo o que via. Os menores fatos que lhe caíam ao alcance, eram aumentados de um lado, diminuídos de outro; fazia‑se outra coisa muito diversa para minha sensibilidade enfermiça, que a imaginação guiava para sentir todos os terrores e ameaças. Perdia a realidade da vista e vivia subdelirante num mundo de coisas grotescas, absurdas e não existentes. Punha‑me a apelar para o Acaso, como se tivesse predileções. Esperava encontrar fortunas perdidas, imaginava impossíveis combinações de acontecimentos que me favorecessem e cheguei mesmo, por instantes, a supor que atos de generosidade de minha parte bem podiam trazer‑me o favor de gênios benfazejos. Pelo correr do dia, depois do almoço, quando me vinha o pensamento da minha situação, entrava no jardim, dia alto e morno. Aqui e ali, gozando o viço educado do parque, encontrava fisionomias fatigadas, tristes, tendo estampada na comissura dos lábios sem forças a irreparável derrota na vida. Ao sol do meio‑dia, dormitavam pelos bancos, sob a sombra de árvores vigorosas. Sentava‑me por minha vez, sonhava alguns minutos, em seguida catava com o olhar o chão, esquadrinhava‑o bem. Era então com o coração palpitante que me abaixava junto à relva para levantar do chão uma velha caixa de fósforos, lavada e desbotada pelas chuvas, já sem rótulo, humilde objeto que tenazmente resistira às vassouradas e às intempéries para atrair o meu olhar maravilhoso. Como se fosse um furto, um crime, apanhava‑a a medo e, depois de inspecionar com cuidado os arredores, abria‑a com respeito, comovido, trêmulo, esperando — oh! meu Deus! — que dentro dela houvesse uma nota de quinhentos mil‑réis. Oh! quantas vezes não apelei para o Acaso, para o Milagre! Quantas! Os deuses vinham‑me ao pensamento com o seu indispensável cortejo de fadas e de anjos... Uma noite, andando eu deambulando por umas ruas desertas do interior da cidade, fui dar não sei a que praça, em que havia ao fundo uma grande casa; ia distraído, completamente entregue às minhas preocupações, cabisbaixo, quando alguém me tomou os passos e me falou com uma voz de apiedar. Era uma mulher andrajosa; parei e ouvi‑a. Balbuciante, contou‑me misérias, a fome dos filhos, moléstias, por fim, não pôde mais falar — prorrompeu em choro... Evoquei logo aquelas histórias de fadas e gnomos, aquelas histórias morais em que os gênios misteriosos vêm pela terra em disfarce, para experimentar os corações dos mortais e eu... e eu dei uma nota de esmola, uma nota graúda que me sangrou fortemente a algibeira linfática. Mesmo depois que sai daquela praça erma, e que de mim se foi a comoção da surpresa, eu esperei a recompensa, a recompensa dos céus para aquele meu ato generoso. Alternativamente apelava para o Mistério e para as potências terrestres. Aferrara‑me a duas amarras, uma no Mistério e outra nas coisas do mundo. Todo o dia ia ao hotel, cheio de alacridade, figurando comigo mesmo ao encontro com o deputado, imaginava‑lhe a bondade do acolhimento, a piedade e a simpatia pelo meu estado e pelos meus desejos. Imaginava‑me daí a dias empregado, num lugar modesto, de renda certa, dentro de um mês indo à faculdade, as atribuições do trote, os apertos do exame, os anos seguindo‑se, as notas, os lentes, a tese, a formatura... [...] Veja mais aqui.

AS POMBAS & MAL SECRETO – No livro Vida e obra de Raimundo Correia (MEC/INL, 1960), biografia e reunião da produção poética do poeta parnasiano Raimundo Correia (1860-1911), encontrei um dos seus melhores poemas. O primeiro, Mal secreto: Se a cólera que espuma, a dor que mora / N’alma, e destrói cada ilusão que nasce, / Tudo o que punge, tudo o que devora / O coração, no rosto se estampasse; / Se se pudesse o espírito que chora / Ver através da máscara da face, / Quanta gente, talvez, que inveja agora / Nos causa, então piedade nos causasse! / Quanta gente que ri, talvez, consigo / Guarda um atroz, recôndito inimigo, / Como invisível chaga cancerosa! / Quanta gente que ri, talvez existe, / Cuja a ventura única consiste / Em parecer aos outros venturosa! Também o seu belíssimo As pombas: Vai-se a primeira pomba despertada... / Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas / De pombas vão-se dos pombais, apenas / Raia sanguínea e fresca a madrugada... E à tarde, quando a rígida nortada / Sopra, aos pombais de novo elas, serenas, / Ruflando as asas, sacudindo as penas, / Voltam todas em bando e em revoada... / Também dos corações onde abotoam, / Os sonhos, um por um, céleres voam, / Como voam as pombas dos pombais; / No azul da adolescência as asas soltam, / Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam, / E eles aos corações não voltam mais... Veja mais aqui.

O TEATRO CONSIDERADO COMO UMA INSTITUIÇÃO MORAL – O texto O teatro considerado como uma instituição moral (Estética Teatral, 1980), do poeta, filósofo e historiador alemão Friedrich Schiller (1759-1805), expressa que: Doi uma inclinação geral e irresistível para o novo e extraordinário, uma ânsia de se sentir num estado de paixão que, como observa Sulzer, deu origem ao teatro. Esgotado pelas exigências eleadas do espirito, esmorecido pelos afazeres monótonos, muitas vezes deprimentes, da profissão e farto de sensualidade, o homem tinha necessariamente que sentir um vazio no seu ser que repugnava ao seu eterno impulso de atividade. A nossa natureza, tão incapaz de permanecer mais tempo no estado intermédio que unisse os dois polos opostos, moderasse a tensão demasiado violenta, transformando-a em doce harmonia, e facilitasse a transição alternativa de um estado para o outro. Ora, esta função só o sentido estetico ou o sentimento do belo a pode desempenhar. Como, porém, o primeiro feito de um legislador prudente deve ser selecionar de entre dois efeitos o maior, ele não se contentará com ter simplesmente desarmado as inclinações do seu povo; utiliza-la-á também, sempre que possível, como instrumento de planos superiores e esforçar-se-á por as transformar em fontes de felicidade. Por isso ele escolheu, antes de tudo, o teatro, que abre o espírito sedento de atividade um domínio imenso, de alimento a todas as faculdades da alma, sem exigir demasiado de uma só, e concilia a educação da razão e do coração com o mais nobre dos passatempos [...] A jurisdição do teatro começa onde termina o domínio das leis humana. Quando a justiça se deixa cegar pelo ouro e engorda a soldo do vicio, quando os crimes dos poderosos escarnecem da impotência dela e o medo dos homens até a mão da autoridade, o teatro toma a espada e a balança e arrasta o vicio até aos pés de um tribunal terrível. Todo o reino da fantasia e da história, do passado e do futuro, está cegamente à suas ordens. Audaciosos criminosos que há muito tempo já se desfazem em pó são agora convocados pela voz toda-poderosa da poesia e repetem, para medonha lição à posteridade, uma vida infame. Impotentes, como sombras num espelho côncavo, os que foram os terrores do seu século perpassam diante dos nossos olhos e é com um horror voluptuoso que amaldiçoamos a sua memória. Quando já nenhuma moral for ensinada, quando já nenhuma religião encontrar crédito, quando já não houver leis, Medeia ainda nos fará estremecer quando desce cambaleando as escadas do palácio e o infanticídio já é um fato. Um horror salutar sempre se apoderará dos homens e, em segredo, todos louvarão o valor de uma consciência tranquila quando Lady Macbeth, terrível sonambula, lava as mãos e conjura os perfumes da Arábia para desfazer o horrendo odor do assassínio. Tão certo como uma representação visível produzir um efeito mais forte que uma letra morta e uma narração fria é o teatro agir de maneira mais profunda e duradoura que a moral e as leis. [...] Veja mais aqui.

UMA MULHER & A ESFINGE – Na Antologia Poética (Cosac Naif, 2014) do escritor do Surrealismo brasileiro Murilo Mendes (1901-1975), destaco inicialmente o poema Uma Mulher: Ela estava no círculo familiar como as outras, / Folheando um livro de gravuras: / A noite nos cercava com seus abismos azuis / E a ideia de quase uma floresta próxima. / Alguém acendeu um candeeiro de petróleo, / As pessoas presentes recuaram no tempo. / Ela se levantou para abrir uma vidraça, / E muito branca, toda vestida de preto, / Seus movimentos ao mesmo tempo lentos e velozes, / Fizeram nascer um começo de dançarina ou de gaivota, / Hélices mexendo, mãos a correr no teclado. / Quando sentou-se era outra vez a mulher. Também o ótimo A Esfinge: Ó Deus / Eu nasci para ser decifrado por ti. / Com um pé no limbo, o coração na estrela Vênus e a cabeça na Igreja / Espero tua resposta desde o princípio do mundo. / Também tu nasceste para mim: / Com tua medalha ao peito, para não esquecer minha origem, / Percorro arfando este deserto. / A palavra definitiva deverá surdir de teus lábios / Ao menos no instante. Por fim, merece destaque o seu poema O homem, a luta e a eternidade: Adivinho nos planos da consciência / dois arcanjos lutando com esferas e pensamentos / mundo de planetas em fogo / vertigem / desequilíbrio de forças, / matéria em convulsão ardendo pra se definir. / Ó alma que não conhece todas as suas possibilidades, / o mundo ainda é pequeno pra te encher. / Abala as colunas da realidade, / desperta os ritmos que estão dormindo. / À guerra! Olha os arcanjos se esfacelando! / Um dia a morte devolverá meu corpo, / minha cabeça devolverá meus pensamentos ruins / meus olhos verão a luz da perfeição / e não haverá mais tempo. Veja mais aqui.


COMO ERA GOSTOSO O MEU FRANCÊS – O excepcional filme Como era gostoso o meu francês (1971), do cineasta brasileiro e um dos precursores do Cinema Novo, Nelson Pereira dos Santos, conta a história de um aventureiro francês conhecedor de artilharia, que no ano de 1594, é capturado e se torna prisioneiro dos Tupinambás. Confinado na tribo ele estava condenado a ser devorado pelos índios como condição de que devorando o inimigo a tribo adquiria todos os seus poderes que eram a utilização da pólvora e os canhões. O filme é ótimo e o destaque dessa vez vai para a atriz e cineasta Ana Maria Magalhães. Veja mais aqui.















IMAGEM DO DIA
Lamentation nº 6, da dançarina e coreógrafa estadunidense Martha Graham (1894-1991)


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Juramento, O passado e o futuro de Hannah Arendt, a poesia de Federico Garcia Lorca, Memorável viagem ao Brasil de Johan Nieuhof, a música de Gabriel Pareyon, a pintura de Leonid Afremov & Vera Rockline, a fotografia de Lionel Wendt, a arte de Rufino Tamayo & Sergio Ramirez aqui.

E mais:
Vamos aprumar a conversa, A Divina comédia de Dante Alighieri, Ensaios de Ralf Waldo Emerson, a música de Mikko Härkin, o teatro de Luigi Pirandello, Macunaíma de Mário de Andrade, a pintura de Mark Gertler & a arte de Guido Crepax aqui.
Os amores de Edneimar, a viúva negra, o cinema de Edward Yang & Elaine Jin, A pintura de Pino Daen & Norman Lindsay, a música de Iara Rennó & Tudo quanto pode o sonho, pode o amor provar aqui.
Se essa rua fosse minha, Manuscrito de Felipa de Adélia Prado, a música de Chiquinha Gonzaga & Clara Sverner, a arte de Luciah Lopez & Quem sabe a vida o amor que nos faz vivo aqui.
Quem vê cara, não vê coração, a música de Fany Solter, a fotografia de Jack Mitchell, a pintura de Fabien Clesse, a arte de Valmir Singh & Entre tombos & topadas a gente leva a vida aqui.
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A ansiedade, a depressão & a medicalização, a  literatura de José Cândido de Carvalho, a música de Schuman & Maria Clodes Jaguaribe, a arte de Shirley Paes Leme & Aldemir Martins, Na festa das vitrines, tudo é do umbigo e o bolso furado no âmago aqui.
E se vem ou vai, eu voou, a música de Jehane Saade, a arte de Manuel Pereira da Silva & Paula Rego aqui.
Festa do dia 8 de dezembro, lavando a jega, a poesia de Florbela Espanca, a escultura de Camille Claudel, a música de Alaíde Costa, a arte de Militão dos Santos & Tatiana Grinberg, Quando tudo se desapruma a farra é só pro desgoverno aqui.
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