segunda-feira, outubro 19, 2009

WALTER BENJAMIN, ÁUREA SANTA CRUZ, MIGUEL JASSELI, LOURDES SARMENTO & MISSIVA DO ESCONJURADO



MISSIVA DO ESCONJURADO



Ôi, mãe!!! Espia eu aqui, visse? E não se abufele com a ausência desse seu filho desnaturado.

A senhora sabe: é uma correria danada na garupa da sobrevivência para não cair morto em qualquer lugar ermo, porque pra gente só sobra assando-e-comendo, mais nada. Só desastre mesmo. E isso desde pirrototinho quando aprontava das minhas peraltices cabeludas, quase comendo todo seu juízo.

Pois eu sei que a senhora virou santa desde minhas travessuras infantis, meus disparates adolescentes e minhas errâncias de adulto. Por isso mesmo que a senhroa dizia que eu era mesmo seus pecados. Nada não.

Agora, metendo as mãos pelas pernas como sempre, quase tenho uma piloura de tanto estresse se não quase estourasse as coronárias antes. Por isso vou driblando os revestrés e cantando Itinerância com a minha pontaria vesga de Cantador pela vida para saltar as vicissitudes adversas, desatando cada nó-cego, tudo numa reação em cadeia, chega penso que a gente é um alvo arrodiado de bronca por todos os lados. É cada chapuletada no toitiço findando no escanteio das possibilidades, com o trauma de viver infincado num verdadeiro buraco negro. Nem tei nem bei: boiando na Alfa do Centauro, avalie.

Realmente, mãe, o Brasil num tá pra gente, não. Nunca teve. Tive uma esperançazinha quando saí da Faculdade com a Carta Cidadã no peito. Já se passaram tantos anos e o que deu? Imagine o que será de mim... a cagada daqui vem de tempos remotos, desde a invasão dos perós. Pá! De lá pra cá, só contramão braba. E os remendos são piores cada dia que se passa.

A coisa só anda certa no reino da Carochinha ou nas previsões do Doro que são pinóias de lascar. No mais, é só banda voou.

Os projetos? Ah, já pelejei demais, mas nunca fiz nada que prestasse. Estou na lona, a vida é só arrependimentos. O que vale é a presepada. Por causa disso eu vou errando mais do que devo.

Mas, mãe, saiba: estou com saudades.

Não leve essa minha distância na conta da ingratidão. É a labuta que é braba mesmo.

A senhora sabe que mora no meu coração e que um dia, quem sabe, Deus dará e eu vou poder estreitar nosso convívio, né?

Receba desse troncho-das-costas-ocas liliputiano aquele beijão melado no coração e saiba que escapando aqui e ali eu vou gritando: mãêêêêêêê!!!!!!!!!!!!! Eu quero a minha mãe!!!!!!!

Fui!

DITOS & DESDITOSPela primeira vez, o espaço em que vive o homem privado se contrapõe ao local de trabalho. Organiza-se no interior da moradia. O escritório é o seu complemento. O homem privado, realista no escritório, quer que o interieur sustente as suas ilusões. Esta necessidade é tanto mais aguda quanto menos ele cogita estender os seus cálculos comerciais às suas reflexões sociais. Reprime ambas ao confirmar o seu pequeno mundo privado. Disso se originam as fantasmagorias do “interior”, da interioridade. Para o homem privado, o interior da residência representa o universo. Pensamento do filosofo alemão Walter Benjamin (1892-1940). Veja mais aqui.

UMA CARTA - Palmares, 30/04/31. Manuel, um amigo veio avisar-me que hoje, às 10 horas, no café do Milhaço, realizou-se uma sessão para a leitura de um artigo em que me reduziam a zero... disse-me mais o amigo que um dos presentes, ironicamente – obrigado, Cyrineu – disse: “Vocês querem escangalhar o Jasseli!” Eu não admiro a fecundidade do rotundo jornalista que, sem escolher melhor local, faz mesmo nos cafés em público, a sua (dele) diligência... Ora, Peixoto, esta gente anda diesorientada. Em, lugar de cuidar da vida, anda a dar importância a quem de covardade retaliopu com a vida sem mais considerações... Há, pois, ao meu ver, nisto tudo, um pouco de medo. Porque, se em nada mais sou; se, politicamente, nada valho aos que, então, tanto artigo tanto cavaco. Eu não respondo, salvo se me atacarem a honra que, então, não escolherei armas para defesa. Eu já disse e repito: nada quero de política! Trabalho pelos meus ideais, pelo desenvolvimento da minha terra. O melhor de meu esforço, quatro anos de labor dedoqieo a Palmares, minha amada terra. Eu digo o que penso e penso o que digo, dou vivas aos meus ideais, grito: viva o Brasil. Viva a prátria livre. Nunca, porém, dei vivas a coletoria. Dura veritas, sed veritas. Se eu for levado a escrever eu mostro que, quando quero, sei ser fornalista. Para a minha defesa, teinho documentos, como você sabe, importantes. Argumentos irrespondíveis, Deus louvado, não me faltam. E se preciso for, tiver de descer deste à ironia, nestes campos, então, arrazo os nossos protuberantes jornalistas. Ora bolas! Às vezes, a gente é forçado a tirar a mácara da modéstia e mostrar que, na humildade, também se esconde um espirito culto. A mediocridade sempre foi atrevida, audaciosa. Não é de agora que os que procuram viver bem com os seus pensamentos são conduzidos pela via da amargura. Neste caso, Peixoto, toco conforme a música. Serei Cristo ou mefistofeles. Estou com a revolução, mas acima de tudo, estou com o que penso. E desejo: 1) Volta ao regime constitucional para avaliarmos o país da crise financeira que atravessamos. 2) Extinção da negação “chefe político”. 3) Moralidade administrativa (neste ponto, Pernambuco vai otimamente e Palmares também); 4 Magistratura e polícia independentes. Com homens cultos e educados – não somente instruídos – afindo, sem distinção, dentro da lei. 5) Liberdade de pensar ressalvados os excessos. 6) Governo democrático, socialista e trabalhista. Não que as “massas” governem. As “massas”, sabemos todos, são inconstantes e incapazes. Forme-se uma “elite” de trabalhistas, de todas as classes, que dentro de um programinha moderno, faça o “governo”. 7) Fomento da agricultura, ao mesmo tempo que redução da importação de maquinismo. A maquina tem sido o fator exclusivo do desequilíbrio financeiro do mundo. 8) Redução, tanto quanto possível, dos latifúndios. 9) Extinção de toda e qualquer lei de arrocho. 10) Simplificação de impostos, como redução da maquina burocrática. 11) Desenvolvimento da instrução popular, gratuita e primaria, e da instrução profissional. 12) Organizações de partidos definidos: democráticos, liberais, comunistas, fascisyas, etc. Tudo isto, Peixoto, sem comunismo. Como tem a França, a Inglaterra. Amem. São Francisco de Campos, o ensino católico obrigatório. Contra isto eu protesto. Escreva quem quiser, onde me encontrarem, ai estarei com os meus pensamentos. Morro de forma, vou fora e cárcere, mas não traio a minha consciência. Quem pensa e age assim, tem dieitos, que lhe não podem ser negados. Creia-me, são poucos dias que permanecerei em Palmates ainda e sempre. Miguel Jasseli. Carta do professor, advogado de formação, teatrólogo, ator e animador cultural Miguel Jasseli (1902 - 1964), em papel timbrado Atheneu Pernambucano, sendo também fundador da Sociedade de Cultura de Palmares, em 1932.

AGORA CHEGOU A VEZ, VOU CANTARA mulher foi e ainda é, na imagética da música popular brasileira, o motivo inspirador fundamental. Cantou-se a feminilidade em todas as suas nuances, conceitos e de todas as maneiras: forma, cheiro, cor e sabor. Ela é descrita nos mínimos detalhes. Seu caráter, sua personalidade, seu jeito de ser, falar, calar, sorrir, chorar, pensar, andar e olhar. Sem contar o estigma da espera, que rima amor com dor. Feliz, amarga, dengosa, sublime, leviana, ela não passa de uma mulher. [...] Desmorona-se o conselho maquiavélico de que “a sorte é mulher e, para dominá-la, é preciso bater0lhe e contrariá-la”. Uma maioria cada vez mais representativa de mulheres faz seu destino e encontra o caminho de sua libertação. Olhando nos olhos dos homens, dizem não ao tempo passado e descobrem que podem ter identidade no futuro. [...] As Marias de agora trazem no corpo uma marca. “Possuem a estranha mania de ter fé na vida”. Com o passar dos dias, param de fazer tudo igual e vão se desfazendo as desigualdades entre mulheres e homens. Criaram uma nova esperança. A de amar e não ter a vergonha de ser feliz. Trechos extraídos da obra A musa sem máscara: a imagem da mulher na música popular brasileira (Rosa dos Ventos, 1992), da escritora, pesquisadora, produtora cultural, consultora e palestrante Maria Áurea Santa Cruz. Veja mais aqui.

OBSERVAÇÃO - O retrato move-se / na sala / observa a paisagem / sob a lua azul / consumindo as hortênsias / dos jardins / O retrato move-se / na moldura de prata / observa as serpentes / e os demônios / observa a filha / despertando o azul do poema / O retrato imóvel / observa o pouso das estrelas / adormece nas mãos azuis / do infinito. Poema da poeta e professora Lourdes Sarmento.




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