sábado, outubro 07, 2017

DERRIDA, AUTRAN DOURADO, KALJU LEPIK, JOHN RUSKIN, IRVING PENN & CLAUDIO TOZZI

QUANDO DÁ ERRADO, MELHOR PUXAR O CARRO – Imagem: arte do pintor e desenhista Claudio Tozzi. - Judlinho não dava uma dentro, as paqueras só nos foras: quero não que você tem as meias com o dedão de fora! Como? Era mesmo. Quando não eram emendadas por remendos escandalosos, os dedos tudo aparecendo, maior vergonha quando tinha de tirar os sapatos. Ou: quero não, sua cueca tem um buraco no furico! Eita! De fato, maior risadagem: só tinha uma cueca, descolorida, desbotada, nódoa de freio no rego da bunda e o orifício no tecido por conta das rajadas de flatulências catingosas. Ou, ainda: quero não, você é o maior peidão! Pense na moganga, o rei dos borborigmos desagradáveis. Pois é, ele já vivia cabreiro: que é que falta essas meninas saberem dele, hem? Tudo sabiam: dos comichões nas partes pudendas que findavam em bronhas desajeitadas, carreira de grude na gola das camisas, sovaqueira da maior inhaca, trejeitos de variado tipo chega dava agonia em quem estivesse por perto, olhadelas indiscretas, que coisa! Estão me brechando, só pode! Sabem tudo de mim, ou tem caboeta na roda queimando o meu filme. Nada de descobrir. Aquietou-se no flerte com as colegas de classe, passou a evitar as do seu tope, todas metidas a besta, beiçudas de ventas empinadas, tudo cu-doce. Começou azarar nas outras classes, viagem perdida: ninguém queria papo com um sujeito broco xexelento daquele, ora! Já havia desistido de flertar, quando apareceu a oportunidade de invadir outro nicco: debandou pras empregadas domésticas, tratadas por ele por piniqueiras: vá escovar os dentes, meu filho! Ou: vá tirar a catinga do mijo que você só anda fedendo. Ou, então: vá arrumar o que fazer, crescer, juntar dinheiro e apareça depois disso, viu? Invocou-se, viu que não levava jeito pra namoricos. Vivia no maior aperto, só amainado certa tarde quando apareceu a professora Nedilicia! Eita! Pra ele a coisa mais linda do universo. Tomou jeito, deu uma repaginada geral e esticou os cambitos na maior dedicação. Oxe, era outro: para quem nunca vira o sujeito agarrado a livros e cadernos, os pais passaram a pensar que ele havia tomado gosto pelos estudos definitivamente. Agora vai. Era não, mas engatou primeira e ia levando como podia, aprendendo a debrear para ver se no papo engatava segunda, nada até agora. Virou aluno da primeira fila, bastava ela cruzar o batente da sala, já se levantava para apagar o quadro negro, ajudá-la a carregar os livros e cadernetas, todo oferecido e pronto para fazer o mundo rodar ao contrário, acaso fosse o desejo dela: é a professora mais encantadora do mundo! A mais bonita, a melhor! Era ele sonhando enquanto ela ministrava os assuntos para todos, sem nem dar conta da presença dele por ali. Era sempre o primeiro a responder as perguntas, nunca faltava uma aula, fazendo de tudo para chamar atenção dela. E ela, nem, nem. Resolveu, então, esperá-la na entrada da escola para ajudá-la a descer do automóvel sobrecarregada de coisas: Pode deixar, professora, eu ajudo a levar. E esmerou-se no carregamento, tornando-se o seu serviçal. E assim, todo dia, já no costume, ganhando um sorriso e até alisado no cocuruto, mais nada. Isso até o dia em que ela chegou apoquentada, estacionou na maior freada, gritou por ele e jogou meio mundo de coisas nos seus braços, com a recomendação: Pelo amor de Deus, não vá derrubar nada, por favor! Mal acabara de dizer, ele partiu na carreira e, ao atravessar a pontezinha pra entrada do colégio, desequilibrou-se de soltar tudo e findar mergulhado no esgoto, melando-se todo e botando tudo a perder. A professora teve um ataque de nervos de gritar: Isso é coisa que se faça, seu desastrado? Mudo, acabrunhado, restou apenas se levantar, sair juntando as coisas no meladeiro, tentar limpar tudo o quanto pode, murchar o rabinho entre as pernas e sair de fininho pra nunca mais. Consigo: É, não levo jeito mesmo pra nada com as mulheres. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especiais com a música da cantora e compositora islandesa Björk: Vulnícura live, Travessia & Live Royal Opera House; do premiado compositor e saxofonista Livio Tragtenberg: Mirroir merengue, A dama da lua & Nervous City Orchestra; do violonista, compositor e arranjador brasileiro Paulo Bellinati: Lira brasileira, Choros & Waltzs of Brazil & Garoto; e da da cantora Marisa Ricco: Meu cais, Um sábio & Reconvexo. Para conferir é só ligar o som e curtir.

PENSAMENTO DO DIA - [...] as grandes cidades da terra tornaram-se centros asquerosos de fornicação e cobiça – a fumaça que se exala de seus pecados penera na face dos céus como a fornalha de Sodoma; e sua poluição putrefaz e pulveriza os ossos e as almas da gente do campo que vive ao redor delas, como se cada uma fosse um vulcão cujas cinzas arrebentassem em pústulas sobre homens e animais [...]. Trecho da obra The Lord's prayer and the church (1880), do escritor, crítico de arte e crítico social britânico John Ruskin (1819-1900).

DESCONSTRUÇÃO & DIFERENÇA – [...] “Desconstruir” a filosofia seria, assim, pensar a genealogia estrutural de seus conceitos da maneira mais fiel, mais interior, mas, ao mesmo tempo, a partir de um certo exterior, por ela inqualificável, inominável, determinar aquilo que essa história foi capaz – ao se fazer história por meio dessa repressão, de algum modo, interessada – de dissimular ou interditar. Nesse momento, produz-se – por meio dessa circulação ao mesmo tempo fiel e violenta entre o dentro e o fora da filosofia (quer dizer, do Ocidente) – um certo trabalho textual que proporciona um grande prazer. [...] Nada – nenhum ente presente e in-diferante [indidifférant] – precede, pois, a différance e o espaçamento. Não existe qualquer sujeito que seja agente, autor e senhor da différance, um sujeito ao qual ela sobreviria, eventualmente e empiricamente. A subjetividade – como a objetividade – é um efeito de différance, um efeito inscrito em um sistema de différance. É por isso que o da différance lembra também que o espaçamento é temporização, desvio, retardo, pelo qual a intuição, a percepção, a consumação, em uma palavra, a relação com o presente, a referência a uma realidade presente, a um ente, são sempre diferidos. Diferidos em razão do princípio mesmo da diferença que quer que um elemento não funcione e não signifique, não adquira ou forneça seu “sentido”, a não ser remetendo-o a um outro elemento, passado ou futuro, em uma economia de rastros [...]. Trechos extraídos da obra Posições (Autêntica, 2001), do filósofo francês Jacques Derrida (1930-2004). Veja mais aqui e aqui.

AS IMAGINAÇÕES PECAMINOSAS - [...] Podia ver o dr. Saturnino à vontade: os mínimos gestos, as mãos grandes e peludas, o timbre da fala grave e distinta, os olhos parados nas nuvens, um jeito de sonhoso. Ele se distraia, brincava girando o anel de chuveiro no dedo, olhava o céu azul estalando sem nuvens, o jardim que via pela janela, lá do alto do estrado. Os olhos detrás das lentes brilhantes dos óculos, o aro de metal. Pedro via os mínimos gestos, os seus mínimos traços, mesmo a ruga entre as sobrancelhas quando voltava a prestar atenção no que lia o escrivão, seu o Tomásio. A atenção certamente fingida, devia saber de cor e salteado aquelas páginas, ele próprio que comandou o processo. Mesmo assim o olhar preso, o ouvido atento de quem está ouvindo pela primeira vez um assunto. Será que na verdade ele finge, pra dar o exemplo? Devia ser, senão tudo não passaria de pantomima, matéria de desocupados. E no entanto ali iam dar um destino à sua vida. A assistência quieta, não se ouvia nenhum sussurro, nenhuma outra voz além da do escrivão Tomásio Preto, que apesar do nome era branco. Só uma vez todo mundo rui, e o dr. Saturnino teve de soar a campainha? Quando leu o lado do exame cadavérico. A linguagem arrevezada do dr. Viriato, que demandava interprete (seu Bê, quando na rua), falando das partes baixas da criação. Do seu cercado de balaustrada feito grade de comunhão, até os jurados riram. O padre Matias, aquele homenzarrão, se encurvava todo para lhe meter a hóstia na boca. Ele menino, depois de grande não ficava bem, podiam dizer que ele era beato ou veado. Com padre Matias não teria acontecido aquilo, o outro era novinho, padre Joel parecia um seminarista [...]. trecho da obra As imaginações pecaminosas (Record, 1982), do escritor, advogado e jornalista Autran Dourado (1926-2012). Veja mais aqui.

A POESIA LÍRICA DE KALJU LEPIKPraga: / Se destruíres nosso povo / Que a chuva vire pedra sobre teus campos. / Que a pedra dispare brotos de pedra. / Que pão de pedra esteja em tua mesa. / Que pétreo seja o chão em que pisas. / Que pétreo seja teu céu acima. / Que o mar vire pedra. / Vire pedra como teu coração é de pedra / Contra nossa terra e nosso povo. Poema Uma poesia por dia, nem sabe o bem que lhe faria, do poeta lírico estoniano Kalju Lepik (1920 – 1999).

BIBLIOTECA FENELON BARRETO
Batendo papo com a estudantada, a professora e escritora Socorro Durán & o diretor da Biblioteca, João Paulo Araújo.

Veja mais:
A música de Björk aqui, aqui e aqui.
Crença pelo direito de viver e deixar viver aqui.
A arte musical de Livio Tragtenberg aqui.
A poesia de Catulo da Paixão Cearense  aqui.
A arte de Paulo Bellinati aqui
O talento musical de Marisa Ricco aqui.
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A ARTE DE IRVING PENN
A arte do fotógrafo estadunidense Irving Penn (1917-2009).