sábado, setembro 23, 2017

QUINTANA, BUKOWSKI, ESPINOZA, CARLOS NEJAR, OTTO FRIEDRICH, SUZANNE VALADON, ARTUR GOMES & O FIM DO MUNDO

SE O MUNDO ACABAR, JÁ ACABA TARDE! - Pra todo lado que eu me virasse, a conversa era uma só. Bastou eu botar a cara na rua logo cedo, apareceu Zé Corninho dando uma de Édipo: - Era bom mesmo que essa desgraça de mundo findasse e levasse toda raça ruim de corno junto! Robimagaiver saiu com a sua: - Zé Corninho, Zé Corninho, num assine sua sentença, ou tais pensando que vai ser só tu de corno que vai sobrar, é, fio duma porqueira? Ocride logo arremedou: - Era bom mesmo que tudo se danasse numa desgraceira só, assim o mundo aprendia, só assim! Afredo mais nem nem, soltou da sua: - Eu mesmo queria ver todo mundo se lascar na vera! Interrompendo, Doro proclamou: - Vamos acabar com essa conversa, senão a gente endoida de vez. Isso é um povinho que só gosta de viver na base do alarme, boatos mais sem pé nem cabeça. Tais pensando o quê, ô abestalhado? Tô só alimentando o converseiro, ora! Pois é, ninguém pensa em corrigir a si próprio, seus comportamentos e atitudes, se é pra consertar o mundo tem de começar por si próprio, senão não adianta nada. Eu mesmo estou salvo, o resto que se dane. Vixe! Cada qual atrelado às suas crenças e convicções se achava verdadeiro dono da verdade. Penisvaldo mesmo mandou ver: - Eu já faço o meu, cada um que cuide do seu; se tem culpado no rolo é a humanidade, essa não tem jeito que dê! E tu é o que fidapeste? Por acaso tu és o melhor dos melhores? Rolivânio, então, entrou na conversa em defesa do parceiro: - Vocês todos estão redondamente enganados, tudinho, se acha certo de tudo, quando, na verdade, todos são culpados pelos problemas de toda humanidade. - Pronto, falou agora o profeta do apocalipse! -, arremedou Robimagaiver: - Tu mesmo só vive de aumentar as coisas, cada mentira cabeluda do creu, só fala de tragédia, gosta de ver a desgraça alheia! Ninguém está nem aí pra nada, só pro umbigo, cada qual cuide de si e Deus por todos nós! Quando não é aquela sacada do “um pra eu, um pra tu, um pra eu”, é aquela choradeira do venha nós vosso reino, pois está escrito: chapéu de otário é marreta. E burro é quem não se aproveita das molezinhas e benesses que aparecem na bobeira. Danou-se! O cabra está cheio de gás! É isso mesmo: o que fica de apurado é que se o mundo acabar, só os outros que vão se ferrar; é que quem leva adiante o papo acha que só ele e os seus é que vão escapar, pois estão salvos justamente por suas crenças e convicções inarredáveis. O papo já estava acalorado quando um, mais bêbado que todos, se intrometeu: - Se o mundo acabar, já acaba tarde! É que já tô bicado, fiz a obrigação pro santo, que venha o desmantelo. Pra mim vai ser um alívio: quando tudo findar mesmo, tomo outra e não tô nem aí. O mundo que se lasque! © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje na Rádio Tataritaritatá especiais com o compositor, saxofonista, flautista, arranjador e produtor musical Leo Gandelman com os álbuns Solar & Vip Vop; a violinista japonesa Midori Goto que também é psicóloga, professora, diretora e criadora do Centro Midori para Envolvimento da Comunidade na Escola Thornton of Music, da USC, nos USA, interpretando uma sonata de Saint-Saens & Concertos de Sibelius & Wieniawski; o premiado poeta, ator e artista gráfico Artur Gomes apresentando Terra de Santa Cruz, Entridentes, Black Billy & Marca Registrada; e a cantora e compositora catarinense Bee Scott interpretando Wasting Love, Som & Fúria, Não te pedi & Every breath you take. Para conferir é só ligar o som e curtir.

FIM DO MUNDO JÁ EM 1755 – [...] uma espécie de barulho estranho e assustador por baixo da terra, parecido com o ribombar oco e distante do trovão [...] O céu, de um minuto para outro, ficou tão tenebroso que eu já não conseguia distinguir nenhum objeto; foi realmente uma Escuridão Egípcia. [...] O terceiro abalo veio uns quinze minutos depois do primeiro. [...] A elevação da superfície da terra e o desmoronamento das grandes construções marcaram apenas o início da catástrofe. Quase que imediatamente ao assentar a poeira do primeiro abalo, irromperam incêndios em meia dúzia de pontos diferentes. [...] Tudo ficou reduzido a cinzas. [...]. Em meio ao colapso e à conflagração, cerca de uma hora depois do primeiro tremor, houve mais uma catástrofe, talvez a mais pavorosa de todas. Enquanto os cidadãos abalados olhavam para o porto do Tejo, as águas subitamente pareceram começar a vazar para o mar. [...] De repente, ouvi uma gritaria geral, 'O mar está vindo, estamos todos perdidos!' Nisso, voltando os olhos para o rio, que tem mais de seis quilômetros de largura nesse ponto, pude percebê-lo subindo e se inflando da maneira mais inexplicável, já que não soprava vento algum; num instante, a uma pequena distância, surgiu uma grande massa d'água, subindo como uma montanha, que entrou espumando e rugindo, e correu com tal ímpeto em direção à costa, que todos saímos correndo na mesma hora, o mais depressa possível, para salvar nossas vidas; muitos foram realmente arrastados, e outros ficaram com água pela cintura a uma boa distância da margem. [...]. Trechos extraídos da obra O fim do mundo (Record, 2000), do jornalista, escritor e historiador estadunidense Otto Friedrich (1929-1995), estudando as catástrofes que se abateram sobre a humanidade, desde os tempos bíblicos ao medo do holocausto nuclear, para analisar a idéia de apocalipse, uma vez que antes evidenciava o temor dos desígnios divinos, hoje é visto como uma vingança da natureza, o que não eliminou, porém, a idéia de uma humanidade pecadora ou culpada. Veja mais aqui, aqui e aqui.

PENSAMENTO DO DIAA alegria é a passagem pela qual o homem atravessa de uma perfeição menor para uma perfeição maior. A tristeza é o passo que um homem dá de uma maior perfeição a outra menor perfeição. Pensamento do filósofo racionalista holandês Baruch Espinoza (1632-1677). Veja mais aqui, aqui e aqui.

CARTAS NA RUA – [...] Levaram-me de volta para casa e ele foi embora com ela. Eu passei pela porta, disse adeus, liguei o rádio, achei meia dose de scotch, bebi aquilo, rindo, me sentindo bem, finalmente relaxado, livre, queimando meus dedos com butucas de charuto; depois fui pra cama, cheguei até a beira, tropecei, caí, caí atravessado no colchão e dormi, dormi, dormi... De manhã, era de manhã e eu ainda estava vivo. Talvez eu escreva um romance, pensei. E foi o que fiz. Trecho extraído da obra Cartas na rua (Brasiliense, 1983), do escritor estadunidense nascido na Alemanha, Charles Bukowski (1920-1994). Veja mais aqui e aqui.

OS ESPELHOS DE NETAN – [...] Os espelhos não sabem como somos, mas como sonhamos! – passou como um reflexo na cabeça de Netan. Os espelhos nos captam os olhos, que também são espelhos. Em outro mais dentro ainda. Como se penetrasse na casca de um relâmpago. Mas o relâmpago é o céu ainda. E ele cairá junto. Cada céu adentro. Via sumirem suas imagens no espelho, como se estivesse de outro lado, ou aparecesse de repente na outra Margem do acontecido. Depois intuiu: - O sonho é o semblante íntimo do espelho, onde nos desvelamos. Sonho e alma são faces que se integram. Na luz. Podia se evaporar a alma. Trecho da obra Um certo Netan (Aché, 1991), do poeta, ficcionista, tradutor e crítico literário Carlos Nejar. Veja mais aqui.

O ESPELHO DE QUINTANAE como se passasse por diante do espelho / não vi meu quarto com as suas estante s/ nem este meu rosto / onde escorre o tempo. / Vi primeiro uns retratos na parede: / janelas onde olham avós hirsutos / e as vovozinhas de saia-balão / como pára-quedistas às avessas que subissem do fundo do tempo / O relógio marcava a hora / mas não dizia o dia. O tempo. / Desconcertado, / estava parado. / Sim, estava parado / Em cima do telhado... / como um cata-vento que perdeu as asas. Poema extraído da obra Melhores poemas (Global, 2005), do poeta, tradutor e jornalista Mário Quintana (1906-1994). Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

ESTUDANTES NA BIBLIOTECA FENELON BARRETO
Batendo papo com a estudante nos eventos da Biblioteca Fenelon Barreto.

Veja mais:
A poesia de Pablo Neruda aqui, aqui e aqui.
O pensamento de Josué de Castro aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
O fim do mundo & a carta do barbeiro aqui.
A arte musical de Midori Goto aqui.
O fim do mundo & as pinóias do tempo de antanho aqui.
A literatura de F. Scott Fitzgerald aqui e aqui.
O cinema de Pedro Almodóvar aqui, aqui, aqui e aqui.
A arte musical de Bee Scott aqui e aqui.
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VERACIDADE
porque trancar as portas
tentar proibir as entradas
se eu já habito os teus cinco sentidos
e as janelas estão escancaradas?
um beija flor risca no espaço
algumas letras de um alfabeto grego
signo de comunicação indecifrável
eu tenho fome de terra
e este asfalto sob a sola dos meus pés:
agulha nos meus dedos
 quando piso na Augusta
o poema dá um tapa na cara da Paulista
flutuar na zona do perigo
entre o real e o imaginário:
João Guimarães Rosa Martins Fontes Caio Prado
um bacanal de ruas tortas
eu não sou flor que se cheire
nem mofo de língua morta
o correto deixei na cacomanga
matagal onde nasci
com os seus dentes de concreto
São Paulo é quem me devora
e selvagem devolvo a dentada
na carne da rua aurora
Poema do premiado poeta, ator e artista gráfico Artur Gomes, editor dos blogs Pele Grafia & Mania de Saúde. Veja mais aqui.

A ARTE DE SUZANNE VALADON
Arte da pintora impressionista francesa Suzanne Valadon (1867-1938). Veja mais aqui.