quarta-feira, abril 26, 2017

LORCA, BERNARD LOWN, MAGDALENA CAMPOS-PONS & AMOR EM ALAGOINHANDUBA

AMOR EM ALAGOINHANDUBA - Alagoinhanduba é um lugar que não existe, só no meu coração e na minha molecagem de aprendiz de poetastro. Para ela eu faria uma canção de amor de filho pródigo desterrado. Todavia, ela é a minha casa, meu abrigo e lugar. Nela sobrevivo e angario meu sustento, alimento esperanças, vomito decepções. Quando ela chora, estou desolado. É quando sei de suas angústias e frustrações: ela sempre sonhou imortalizada feito Macondo, Antares, Dublin, ou o Aquário das Cobras, ou mesmo aquela que Paris só é melhor à noite. Infelizmente, o único filho que se poderia considerar por ilustre, desculpe a imodéstia, sou eu aquele que é o cúmulo do anonimato entre os inúteis. Triste sina, a dela. A par de tudo isso, asseguro: ela é só de nome, um distrito perdido no mapa, onde a vida mais parece desenho animado. Não há rio, deságua seus lamaçais. Todo dia e o ano todo, a vida é uma só: ou chuva, ou ensolarada, só inverno ou verão, sem meio termo, só eu e ela, meio a meio. As suas ruas, umas com nomes de santos, outras na glória dos seus vencedores, como a sua principal atração que se diga turística, a Praça Coronel Tinhoso da Gruta, montada no cume do morro, e que o povo só trata por Catombo da Bêba; ou a Travessa Prefeito Bordão que ninguém sabe ou lembra mais nem quem foi, pois a ela só se refere como o Beco do Cu da Mãe. Nela se faz de tudo: abusos, chantagens, malquerenças, arrumadinhos, blasfêmias e pirataria. Nela se mata, arranca, enterra, cavouca e revira insepultas desavenças, escabrosas vilanias, indecorosas safadezas. Só se vê o prefeito Zé Peiúdo em conchavo com os poderosos para se manter no poder, mandando o cabo distribuir lotes da beira do rio pros eleitores achegados, e os capangas a dar sumiço em tudo quanto for de putas e gays na localidade. Lá Tomé e Vitalina todas as tardes às escondidas trocam juras de amor no banco da praça deserta, e no meio de um sarro pesado são surpreendidos por ladrões que levaram seus pertences, não antes abusar libidinosamente dos dotes dela. Biritoaldo junta pules de bicho e canhotos da loteria de domingo a domingo, apelando pra sorte na esperança de arribar desse lugar odiento pra ele. Zé Corninho serra tronco das árvores a mando do dono que maldiz todo dia dos prejuízos que elas deram às suas casas e casebres que ruíram pelas raízes. Robimagaiver na maior faxina dentro de casa, juntando o que acha de imprestável na sua mania de colecionar o que lhe cai às mãos, e ao sair do aluamento joga tudo no primeiro terreno baldio que encontrar pela frente que sirva de lixão. Cada morador ama esta cidade ao seu modo: entre xingamentos, fofocas, ganâncias, bofetadas, abrindo valetas, levantando muros, promovendo intrigas. Como em qualquer lugar, os fieis rezam na igreja por suas misérias, esponsais comparecem às obrigações do coito, fossas e lixos alagando meio fio, a festa dos insetos pelos arruados emporcalhados por pôsteres e cartazes dos políticos, comemorações entre fezes de animais mortos ao relento, inaugurações entre esgotos a céu aberto, monturos e detritos, procissões pelas guaritas e lixeiras destruídas nas calçadas iguais as ruas esburacadas, passantes pra e pra cá entre os entulhos, muco, pus, catarro, santos e crucifixos, discussões entre metralhas, poças, matagal, sacos plásticos levitando aos ventos; namoricos entre moedas pelos regos com pedaços de fios, arames, vidros, cordões, retalhos, madeiras e pegadores, traições com maçanetas, parafusos, telhas, galhos, folhas e fotos, enterros entre flores, papéis, caixas, pregos, roelas, clips, caqueiras e latões, colações de grau pelas varetas, rótulos, bisnagas, cachetes e flâmulas, comícios entre botons, sacolas, sandálias, panelas e talheres, homicídios entre brinquedos, penicos, livros, balas e bulas, a vida toda entre destroços, tapumes e escombros. Cada qual se livra das broncas jogando pro lado, ou pro quintal do vizinho ou soltando na primeira esquina: agora o problema é dos outros. A cidade que chore, definhe, apodreça, cada um que se vire, resolvendo o seu, o resto se dane. A cidade é o retrato do povo que nela habita. Até que um dia, por desgraça do destno, enforcou-se o último alagoianhandubense com as tripas do último índio que havia na redondeza. A cidade foi varrida do mapa e tudo se perdeu numa brecha do tempo para nunca mais. © Luiz Alberto Machado. Veja mais aqui.

BODAS DE SANGUE DE LORCA
(Minutos antes acabam de partir o noivo e sua mãe, que vieram pedir a mão da noiva em casamento e deixaram presentes). CRIADA Estou louca para ver os presentes. NOIVA (áspera) Sai! CRIADA Ai, menina, deixe eu ver! NOIVA Não quero. CRIADA Ao menos, as meias. Dizem que são todas rendadas! NOIVA Já disse que não! CRIADA Por Deus. Está bem. É como se não estivesse com vontade de casar. NOIVA (mordendo a mão com raiva) Ai! CRIADA Menina, filha, o que você tem? É pena de deixar tua vida de rainha? Não pense nessas coisas tristes. Tem algum motivo? Nenhum. Vamos ver os presentes. (apanha a caixa) NOIVA (agarrando-a pelos pulsos) Larga. CRIADA Ai, mulher! NOIVA Larga, já disse. CRIADA Tem mais força que um homem. NOIVA Não tenho feito trabalho de homem? Antes eu fosse! CRIADA Não fale assim! NOIVA Cale-se já disse. Vamos mudar de assunto! CRIADA Você ouviu um cavalo ontem à noite? NOIVA Que horas? CRIADA Às três. NOIVA Era algum cavalo solto? CRIADA Não era, tinha cavaleiro! NOIVA Como você sabe? CRIADA Porque eu vi. Estava parado na sua janela, estranhei muito. NOIVA Não seria o meu noivo? Algumas vezes ele passa essa hora! CRIADA Não. NOIVA Você o viu? CRIADA Vi. NOIVA Quem era? CRIADA Era Leonardo. NOIVA (forte) Mentira! Mentira! O que veio fazer aqui? CRIADA Veio. NOIVA Cale-se! Maldita seja a sua língua! CRIADA (à janela) Olha. Chega aqui! Era? NOIVA Era.
Trecho da peça teatral Bodas de Sangue (Agir, 1968), do poeta, dramaturgo espanhol Federico Garcia Lorca (1898-1936). Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

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A arte da pintora, fotógrafa, escultora, performer e artista visual cubana María Magdalena Campos-Pons.

CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Paz na Terra: [...] Sinto-me por vezes desanimado quando vejo que, após investir muito tempo na coleta de detalhada história médica que me diz exatamente o que há, o paciente de mostra incrédulo. Mas, quando o levo para minha sala de exames, onde tenho a um canto um antiquado fluoroscópio com intensificador de imagens, máquina cujo painel de instrumentos se assemelha ao de um avião, o paciente fica impressionado e posso imaginá-lo dizendo com seus botões:”Ah, que bom estar num consultório tão bem equipado”. Ou talvez: “O doutor vai usar comigo essa máquina maravilhosa?”. A fé pueril na magia da tecnologia é uma das razões pelas quais o público vem tolerando a desumanização da medicina. [...].
Trecho da obra A arte perdida de curar (Peirópolis, 1998), do médico, professor e inventor lituano Bernard Lown, que só aceitou o Prêmio Nobel da Paz de 1985 em nome dos Médicos Internacionais para a Prevenção da Guerra Nuclear, que fundou com o cardiologista russo Yevegeny Chazov.
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