CLEÓPATRA (69.aC – 30 aC) – Filha de
Ptolomeu Auletes, o Tocador de Flauta – o mesmo que assassinou sua filha
Berenice e compôs-lhe uma elegia para o funeral - , não era egípcia,
descendente de um dos generais greco-macedonios de Alexandre Magno. Cleópatra
tinha o dom da dramatização. Durante toda a vida desempenhou seu papel como uma
atriz consumada. Mulher de assombrosa versatilidade, sabia discutir pintura,
escultura, poesia, teologia, negócios de Estado, Filosofia e religião com os
homens mais cultos da época. Sua esplendida personalidade era tecida de fios de
variegadas cores. Era brilhante, encantadora, astuta, cruel, frívola, diplomática,
oportunamente generosa, sobretudo consumida continua e completamente por uma
sede de poder ilimitado. Quando ela assumiu o poder em 51aC, contando com
apenas 17 anos de idade, Cleópatra já era admirada por suas qualidades de
estadista, inteligência, energia, sentido de grandes projetos e, também,
paciência e tenacidade. Crescera em meio ao tumulto e à angústia da guerra, da
invasão. Conheceu a humilhação da ocupação estrangeira, a arrogância e a
brutalidade dos romanos, os caprichos rústicos e ruidosos daquela população
mestiçada que habitava Alexandria, a docilidade e a resignação dos camponeses
curvados pelo peso de milênios de submissão. Por mais que tivesse orgulho de
sua ascendência real e de sua herança macedônica, sentia uma profunda simpatia
pelo povo egípcio, com suas virtudes ancestrais, seu amor pela paz, sua
harmonia com os elementos e as estações do ano. De natureza generosa, orgulhosa
e ousada, ela se indignou quando o jugo de Roma pesou sobre aquele país cuja
civilização era tão mais antiga e refinada. Acalentou o sonho e a ambição de
livrar seu povo da tirania estrangeira. Todos os atos de seu governo e seu
comportamento pessoal indicam que Cleópatra desde sempre acalentou a
possibilidade de reinar sobre um vasto domínio, além- fronteiras. Era apaixonada
pela glória e pelos homens. Em suma, era um gênio na refinada arte de viver. Lutando
contra o destino apenas com as armas da beleza e do talento, quase logrou
transformar Roma numa província do Egito. Sua vida terminou numa tragédia. Ela até
hoje tem sido chamada a amante de todos os poetas do mundo, e a anfitrião de
todos os folgazões.
CLEÓPATRA & CESAR –
Animado com sua vitória sobre Pompeu, César acabava de chegar a Alexandria. Era
fins de 48aC, o rei Aulete morrera; e dois dos seus filhos, Ptolomeu e
Cleópatra, preparavam-se para disputar a sucessão do trono. Quando César
chegou, Cleópatra estava no exílio. Um fâmulo correu a avisar César: - Um
viajante acaba de chegar do Levante. Traz uma coleção de tapeçarias raras que
deseja mostrar-lhe. – Onde está ele? – O guarda do portão não o quer deixar
entrar, senhor. – Dize ao guarda que deixe esse homem vir até cá em seguida. O
viajante, com o farde de tapetes sobre o ombro, foi trazido à presença de
César. – O senhor nunca viu coisa parecida com esta que vou lhe mostrar. Dito
isto, largou cuidadosamente no chão o maço de tapetes e começou a desenrolá-lo.
Respondeu com um riso ao olhar espantado de César. – Eu não tinha razão,
senhor? Mas César estava mudo. De dentro dos tapes, com os cabelos desgrenhados
e rindo à socapa como uma colegial, saltara Cleópatra, a filha do rei egípcio. Nela
estava a metade civilizada e a metade bárbara familiar da estouvada princesa
que surgiu do fardo para implorar o auxílio de César a fim de reaver o trono. Um
torvelinho de soltos cabelos ruivos, um riso sedutor, gestos desenvoltos e
buliçosos, gracejos espirituosos expressos em perfeito latim com delicioso
sotaque grego. Impossível resistir a essa cativante jovem de vinte primaveras egípcias.
César, conhecido como o Marido de Todas as Mulheres (Omnium Mulierum Vir),
estava escravo dos mais insignificantes caprichos dela. Ela induziu César a
enterrar os dedos maculados no corrupto bolo egípcio. Persuadiu-o a matar
Ptolomeu, jovem irmão e rival dela no pretender o trono. Convidou-o então para
uma excursão pelo Nilo na sua barca real de ouro e púrpura. Enquanto ele um
velho soldado epiléptico, ela uma jovem aventureira ambiciosa, ambos sonhavam
um sonho dourado de conquista. E ela, com a ajuda de César, esperava tornar-se
a senhora do mundo. Enquanto ela lhe dava um filho e herdeiro, Roma
impacientava não podendo o seu general definhar entre os afagos de uma mulher
estrangeira. Apaixonado crepuscular, ele resolveu regressar antes com uma
vitória militar do que com um triunfo amoroso, e comunicou: Veni, vidio, vici
(Vim, vi, venci!), sob a inspiração de Cleópatra ele aprendera a considerar-se
um deus, e a vangloriar-se como se fosse um deus. A Senhora do Nilo começou a
estabelecer planos para derrubar a república romana, enquanto ele prometeu que
assim que se tornasse rei, desposaria Cleópatra legalmente e a faria rainha. Então,
eles transfeririam a capital de seu império, de Roma para Alexandria. Era o
sonho dela e a paixão de César um aguilhão, o filho divino de Júpiter para todo
o sempre. Assim, ela se tornara afinal senhora do mundo. Num esforço para
calmar sua agitação, ordenou que um de seus escravos fosse suspenso no teto de
cabeça pra baixo. Um tanto aliviada por esse divertimento – seu remédio preferido
para aquietar os nervos agitados – ficou impacientemente à espera de
importantes notícias do senado. Não foram boas, César fora presenteado no
senado romano com vinte e três punhaladas. Ela retorna ao Egito com um grande
vazio no coração.
CLEÓPATRA & MARCO ANTONIO – Ela havia
jogado as maiores paradas e perdera, mas Marco Antonio era um exemplar fora do
comum das virtudes e fraquezas humanas. Juntamente com Otaviano e Lépido, eles
formaram o triunvirato ditatorial. Com isso, ele fora em missão ao oriente,
quando conheceu Cleópatra, de quem tornou-se escravo: - Se quiser ver-me, deve
vir à minha galera como meu convidado -, disse-lhe ela em resposta ao
chamamento dele. Ele aceitou e se achou num jardim encantado: sereias, cupidos
e graças dançavam sobre um convés juncado de flores, enquanto um grupo de
raparigas com flautas tocava uma música suave, e uma nuvem de incenso inebriava
docemente os sentidos, fazendo tudo esquecer. Ataviada com as vestes soltas e
semitransparentes da deusa Vênus, ela estava sentada debaixo de um toldo
franjado de ouro, e acolheu Antonio com um sorriso de maliciosa humildade. Ele fez-lhe
presente de seu coração, suas esperanças e sua vida. A principio espantou-se
com o que Plutarco descrevera como sendo suas as maneiras rústicas, fato que
fez com que ela, soberba atriz, adaptasse suas maneiras às de Antonio:
percebendo que as chalaças dele eram brutas e sórdidas, e que tinham mais do
soldado que do cortesão, ela respondeu com a mesma moeda e descambou para essa
disposição de espírito sem nenhuma relutância ou reserva. Sucederam-se
banquetes régios, a ponto de apostas entre ambos, resultando ao final do
combate que Antonio dissera: - Basta! Você ganhou a aposta! E mergulharam em
doidices: farsas, mascaradas, bebedeiras, piqueniques, excursões, danças,
corridas de carros e até mesmo visitas acidentais às tabernas, disfarçados de aldeões
ou escravos. Enquanto ele enlanguescia na alcova egípcia, Otaviano consolidava
sua própria posição em Roma. E se Antonio era um canalha de bom gênio, Otaviano
era um patife de maus bofes. Antonio divorciou-se de Otávia, casou com
Cleópatra e proclamou-se libertador de Roma, os dominadores do mundo. Enfrentando
Otaviano, sucumbe Antonio: abandonou todos que estavam lutando e dando suas
vidas por ele, seguiu atrás dela para Alexandria, quando ela já se destinara a
desposar Otaviano que veio vê-la depois que Antonio se matou. Veio, viu e não
foi conquistado: queria ela capturada como prisioneira de guerra. Ainda que
prisioneira, logrou introduzir a serpente em seus aposentos escondida dentro
duma cesta de frutas. E assim a insaciável princesa, a mortal que supunha
dominar o mundo, recebeu seu completo e final quinhão de gloria humana. Ofereceu
um banquete real aos vermes famintos.
REFERÊNCIAS:
BRUSSAUD, Jean-Marc. O Egito dos faraós. Rio de Janeiro: Otto Pierre,
1978.
SILVA, José Carvalho. História universal. São Paulo: Ridel, s/d.
TANNAHILL, Reay. O sexo na história. Rio de Janeiro: Francisco Alves,
1980.
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