sábado, setembro 02, 2006

EXÓRDIO, GUIMARÃES ROSA, GOLDONI, ALBERTA, QUINTILIANO, GUBAIDULINA, ZINAIDA, SANDRA SALGADO, PSICANÁLISE, REVOLUÇÃO DE 1817 & MUITO MAIS!!!




 EXÓRDIO - Abri a porteira do mundo em 1960, numa provinciazinha da Mata Sul pernambucana, sob o signo de mercúrio, uma fome desgraçada e com o berro pelos ares acordando todo mundo. Na hora do rebento os meus parentes e presentes já sentenciaram: - Esse menino quer aparecer! Pelo choro demasiado, minha mãe desconfiou logo que eu seria, então, um daqueles cantores de brega e, por cima, desafinado. Meu pai, mais reticente, estava lá na biblioteca entretido com seus livros, fez de desentendido e cochichou pra si: - Esse vai ser mais um pra azucrinar o mundo. E foi, na batata! Mais tarde mudaram o verbo: - Esse menino gosta mesmo de aparecer! Verdade: logo cedo publiquei umas baboseiras infantis no suplemento "Júnior", do Diário de Pernambuco. Iapois, tá. Mas foi ali naquela vida besta de interior que aprendi a chupar cana, dar o dedo e plantar bananeira. Isso sem contar com os aperreios tantos que provocados pelas travessuras muitas. E se não fosse a maravilhosa professora do primário, eu nunca me meteria a querer ser poeta. A culpa é dela. Nesse tempo vivia Lobato, Batman, gibis, Defoe, figurinhas e arteirices. Meus pais, parentes, aderentes e achegados sempre tiveram paciência comigo. Mais taludo e quase precoce homem-feito, já me perguntava pra que droga que servia guerra, religião, pobreza, usura, preconceito e enrolação. Pra quê mesmo, hem? Aí, com certeza, parece que já havia sinais que auto-enlouquecia, como diz um amigo meu. Leituras? Foi por causa de Hermilo e de Ascenso que viajei Graciliano, Érico, Osman Lins e Machado de Assis. Estava adolescente dando murro em ponta de faca, remando contra a maré, aos trancos e barrancos, doido de pedra e sem um pingo de juízo, como de resto fora toda a minha insignificante existência. Futebol? Claro: rubronegro do Sport Recife & flamenguista de Fio, Rodinelli, Zico e dos de hoje – ave! Ao mesmo tempo a cabeça no som de Gonzaga, Capiba, Vivaldi, Gismonti, Yes, Chico e Hermeto. Sem contar com os olhos pregados em Rosa, Pessoa, Drummond, Joyce, Borges e Clarice. Doidice pura. Terminado o colegial, escolhi o curso de Letras na faculdadezinha da minha cidade. Daí arribei pra Recife onde me deram uma corda da gota para publicar meus garranchos e rabiscos produzidos na adolescência. Publiquei. E como a turma atiça o cara pra brigar ou escrever, optei escrever e, depois, ver se vale à pena brigar. Foi aí que inventei de conhecer as leis para aprender a brigar por meus direitos. Torceram tanto para que fosse douto jurisconsulto que afundei na leitura e descobri que os homens fazem da justiça uma instituição bastante injusta. Saí mais torto do que quando entrei. Pudera, avalie. Nesse meio termo, num sei por que cargas d'água me puseram numa emissora para redigir notícias e escrever uma crônica diária. Eu sei que foi para tapar buraco, o redator havia se desligado e não dispunham de gente que escrevesse. Pronto, fiquei todo ancho e peguei o vício que até hoje não consigo largar: falar que só o homem da cobra e escrever que só escrivão de polícia. Repare só. Aí trupicando nos meus solecismos eu vou inventando uma sintaxe para enganar os bestas mais bestas que eu. Mas escrever, mesmo para um charlatão, num é fácil não. E como não sou mestre, a coisa nasce meio atrapalhada. É cada troca de tapa com o vernáculo, tabefe vai e vem com as palavras, puxavanques nas orações, arenga com despropósitos gramaticais, até que elas ganham (ou eu tapio que venci) e sai o texto. Atabalhoado ou não, sai. Isso quando não ocorre uma briga de foice das brabas com o papel em branco, nossa! O papel, um Mike Tyson; eu, um pelanco de gente metido às pregas. Uso das minhas artimanhas, tá! É como Davi e Golias, sabe? Só que enquanto ele fica imóvel, dou minhas cutucadas. Pois é, enquanto não me coibirem de dizer leseiras ao léu, vou assim. Vamos nessa? Rumbora. Vamos aprumar a conversa & tataritaritatá! (Luiz Alberto Machado). Veja mais aqui e aqui.

 Imagem: a arte do pintor, ilustrador e escultor estadunidense Howard Rogers.


Curtindo o álbum In Tempus Praesens concerto for violin and orchestra (Bis, 2007), da compositora russa Sofia Gubaidulina, performer de Vadim Gluzman, conductor Jonathan Nott & Lucerne Symphony Orchestra. Veja mais aqui e aqui.

EPÍGRAFEBrevis est institutio vitae honestae bearaeque, si credas, frase atribuída ao orador e professor de retórica romano Marco Fábio Quintiliano (35 – 100dC), que se traduz por: fácil é o caminho da vida honesta e feliz, quando se crê. Veja mais aqui.

REVOLUÇÃO DE 1817 – No livro Cronologia pernambucana: subsídios para a história do agreste e do sertão (CEHM/FIAM, 1983), do jornalista, historiador, pesquisador, lexicógrafo e compositor Nelson Barbalho (1918-1993), recolho o trecho que fala da Revolução Pernambucana de 1817: [...] O barril cheio de explosivos, acolhendo mil motivos, preparado em várias fontes unidas entre si sob a bandeira do republicanismo liberal, estava pronto para ir pelos ares – e seu estopim foi a agressão do preto pernambucano contra o branco português. As escaramuças que se seguiram nas ruas do Recife, entre pernambucanos e portugueses, são o consequente fogo a alimentar o pavio e apressar a explosão do barril revolucionário. E assim, aos 6 de março de 1817, no informe de Pereira da Costa (Anais, VII, 379), rebenta uma insurreição militar no quartel do Regimento de Artilharia do Recife, fato que deu origem à precipitação do rompimento da revolução emancipacionista, projetado para um pouco depois, pela páscoa. É com a revolução pernambucana que se popularizam no Brasil os termos pátria e patriota. [...] A palavra revolução, que vinha do baixo latim com significado astronômico de revolução do tempo, ato de retornar, de fazer a voltar, adquiriu o significado de mudança repentina e violenta, no governo de um Estado, durante a Revolução Francesa, e com esse emprego apareceu em 1817, tal como revolucionário, que também surgira na França em 1794 [...] Veja mais aqui, aquiaqui.

PSICANÁLISE – O termo psicanálise, segundo Roudinesco (1998) é oriundo de Psychoanalyse, termo criado por Sigmund Freud, em 1896, para nomear um método particular de psicoterapia (ou tratamento pela fala) proveniente do processo catártico (catarse*), de Josef Breuer e pautado na exploração do inconsciente, com a ajuda da associação livre, por parte do paciente, e da interpretação, por parte do psicanalista. Por extensão, dá-se o nome de psicanálise: ao tratamento conduzido de acordo com esse método; à disciplina fundada por Freud (e somente a ela), na medida em que abrange um método terapêutico, uma organização clínica, uma técnica psicanalítica, um sistema de pensamento e uma modalidade de transmissão do saber (análise didática, supervisão) que se apoia na transferência e permite formar praticantes do inconsciente; ao movimento psicanalítico, isto é, a uma escola de pensamento que engloba todas as correntes do freudismo. No plano clínico, ela é também a única a situar a transferência como fazendo parte dessa mesma universalidade e a propor que ela seja analisada no próprio interior do tratamento, como protótipo de qualquer relação de poder entre o terapeuta e o paciente e, em caráter mais genérico, entre um mestre e um discípulo. Sob esse aspecto, a psicanálise remete à tradição socrática e platônica da filosofia. Por isso é que empregou o princípio iniciático da análise didática, exigindo que se submeta à análise qualquer um que deseje tornar-se psicanalista. Freud foi o iniciador de uma inversão do olhar médico que consistiu em levar em conta, no discurso da ciência, as teorias elaboradas pelos próprios doentes a respeito de seus sintomas e seu malestar. Mediante essa reviravolta, a psicanálise esteve na origem dos grandes trabalhos históricos do século XX sobre a loucura e a sexualidade. Foi num artigo de 1896, redigido em francês e intitulado “A hereditariedade e a etiologia das neuroses”, que Freud empregou pela primeira vez a palavra psico-análise. Após muitas hesitações, cuja evolução pode-se acompanhar na correspondência entre Freud e Carl Gustav Jung, a palavra psicanálise se imporia em francês em 1919 (em lugar de psico-análise), ao lado de Psychoanalyse, já aceita no alemão em 1909 (em vez de Psychanalyse) e de psychoanalysis, em inglês (muitas vezes grafada como Psycho-analysis ou Psycho-Analysis). Em 1910, em “As perspectivas futuras da terapia psicanalítica”, Freud delimitou um enquadre “técnico” para a análise, afirmando que esta tinha por objetivo vencer as resistências. Essa tese seria discutida muitas vezes, e os problemas da técnica seriam objeto de diversos outros artigos, além de debates e cisões na história do movimento psicanalítico, desde Sandor Ferenczi até Jacques Lacan. Inspirando-se no modelo darwinista, Freud quis incluir a psicanálise entre as ciências da natureza, ou, pelo menos, conferir-lhe um estatuto de ciência dita “natural”. E por causa da dupla pertença da psicanálise (ao campo das ciências da natureza e ao das artes da interpretação) que sua chamada refutação “científica” produziu-se no campo da terapêutica. A história da psicanálise mostra que as resistências erguidas contra ela, bem como seus conflitos internos, sempre foram o sintoma de seu progresso atuante, de sua propensão a fabricar dogmas e de sua capacidade de refutá-los.
Essa postagem, portanto, é o pontapé inicial para uma série de outras postagens a respeito da temática. Para tanto, segue abaixo uma bibliografia suplementar para melhor conhecimento a respeito do tema. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
REFERÊNCIAS
ALBERTI, S.; FIGUEREDO, C. (Orgs.). Psicanálise e saúde mental: uma aposta. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2006.
ATKINSON, Richard; HILGARD, Ernest; ATKINSON, Rita; BEM, Daryl; HOEKSENA, Susan. Introdução à Psicologia. São Paulo: Cengage, 2011.
BOCK, A.M et al.  Psicologias: uma introdução ao estudo da psicologia. São Paulo: Saraiva, 2001
DAVIDOFF, Linda. Introdução à Psicologia. São Paulo: Pearson Makron Books, 2001.
ETCHEGOYEN, R. Horacio. Fundamentos da técnica psicanalítica. Porto Alegre: Artmed, 2004.
FADIMAN, James; ROBERT, Frag. Teorias da personalidade. São Paulo: Harbra, 2002.
GAZZANIGA, Michael; HEATHERTON, Todd. Ciência psicológica: mente, cérebro e comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2005.
LAPLANCHE; Jonh; PONTALIS, J. B. Vocabulário de psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
MEZAN, Renato. Interfaces da psicanálise. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2002.
MORRIS, Charles; MAISTO, Alberto. Introdução à psicologia. São Paulo: Pretence Hall, 2004.
MYERS, David. Psicologia. Rio de Janeiro: LTC, 2006.
ROUDINESCO, Elisabeth. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.
SCHULTZ, Duane; SCHULTZ, Sydney. Historia da psicologia moderna. São Paulo: Cengage Learning, 2012.
ZIMERMAN, David. Vocabulário contemporâneo de psicanálise. Porto Alegre: Artemd, 2008.
______. Fundamentos psicanalíticos: teoria, técnica, clínica – uma abordagem didática. Porto Alegre: Artmed, 2007.
______. Manual de técnica psicanalítica. Porto Alegre: Artmed, 2004.


SAGARANA – No conto Sagarana, do livro homônimo (José Olympio, 1974), do escritor, médico e diplomata João Guimarães Rosa (1908-1967), destaco o trecho que menciona a expressão batizado com água quente: [...] Isto aqui é uma terra terrível, doutor... eu mesmo... o senhor me vê mansinho deste jeito, mas eu fui batizado com água quente!... [...]. A expressão mencionada compreende aquele sujeito que é desordeiro, um tipo perigoso, alguém que tem carta de valente e não leva desaforo para casa. Veja mais aqui e aqui.

TODO DIA É DIA DA MULHER: SANDRA SALGADO (Foto: Acervo LAM) - A poeta e funcionária pública Sandra Magalhães Salgado reúne seus poemas sob a denominação de Voos Poéticos. Entre eles destaco A metade inteira de mim: A inquietude me toma / como a dizer que / o mundo não para / sou só um pedaço de mim / a outra metade vagueia / Nem sei o que procuro de mim / Além dessa outra metade / e procuro em ti o que me quero / tu és quase inteiro, cheio de si / E eu procuro uma metade / inteira, que saiba ser / para o outro / o que quero ser para ti / Esse querer ser ao outro / não existe n´algum lugar / mas em mim, / acho que isso é amor. Veja mais dela aqui, aqui e aqui

BERTOLDO, BERTOLDINO E CACASSENO – O dramaturgo veneziano Carlo Goldoni (1707-1793), é autor do drama cômico musicado que envolve os personagens Bertoldo, Bertoldino e Cacasseno, cuja estreia se deu durante o carnaval do ano de 1749, figuras cômicas populares da literatura escrita e oral italiana. Bertoldo é um vbelho astuto e malicioso, sentencioso e mordaz. Bertoldinho é estupido e desastrado, ao passo que Cacasseno, que também é entendido como um cagajuizo ou cagasentenças, simplório e asneirento. A saga do primeiro começou quando, no início do século XVII, Giulio Cesare Croce publicou o livro Astuzie sottilissime di Bertoldo, uma compilação de anedotas e sentenças que logo se tornou popularíssima. Ou seja, Bertoldo, tipo rustico, era reabilitado depois de ter o homem do campo sido alvo de sátiras cruéis durante séculos. E, por isso, o livro se tornou popularíssimo entre as gentes simples, dos vilarejos e aldeias. Alguns dos mais célebres poetas italianos daquele século dedicaram versos tanto a Bertoldo como a Bertoldino e Cacasseno, formando-se, assim, um longo poema de aventuras. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.



VIVE L’AMOUR – O filme Vive L'Amour (1994), dirigido por Tsai Ming-liang, conta a história de uma corretora de imóveis que tenta matar pernilongos com dificuldade num dos apartamentos que pretende vender, tratando da dissolução de formações sociais mais antigas como a família, o clã, as relações de troca, sexo e afetividade. Nesse filme os personagens estão condenados e descobrir por conta própria qualquer sentido de existência para além do trabalho, e nenhum momento dá-se certeza de que esse sentido sequer permaneça a existir na Taipei modernizada ao redor. Assim, ao invés de descobrir o amor prometido no título irônico do filme, a heroína só pode se reencontrar fora dos arranha-céus com fantasmas, numa praça destruída que se assemelha a seu espírito igualmente devastado. O destaque vai para as atrizes Yang Kuei-mei e Lu Yi-Ching. Veja mais aqui e aqui.


IMAGEM DO DIA
Todo dia é dia da sempre belíssima e saudosa atriz canadense Alberta Watson (1955-2015).


Veja mais Ah, esses lábios, Molière, Eduardo Souto, Tácito, Washington Irving, Sandra Fayad, Luciah Lopez, Gladys Nelson Smith, Clara Sverner, Carl Franklin, Renée Zellweger & Bill Ward aqui


E mais também Gilberto Mendes, Sandra Scarr, Paul Feyerabend, Brian de Palma, Chaim Soutine & Penelope Ann Miller aqui.
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
A leitora Tataritaritatá na expressão artística da pintora russa Zinaida Serebriakova (1884-1967).
Veja aqui e aqui.
 
 
 
CANTARAU: VAMOS APRUMAR A CONVERSA
Recital Musical Tataritaritatá
Veja aqui.

TODO DIA É DIA DA MULHER
Veja as homenageadas aqui.