sexta-feira, julho 28, 2017

COLHENDO SONHOS NOS GALHOS DA VIDA


Ainda ontem semeava futuro tropeçando no presente.
Distâncias sem fim e o triz nas perdas do tempo que sangram escombros de agora.
Sou rios das terras que deixei e deságuam na minha solidão.
Mais que nunca a voz ao muro, como um pé na porta e a fuga do frio.
Há muito mais que olhar pros lados e ver apenas o que está visível.
Intenções ignoradas, afetos roubados, emoções escondidas, eu sinto mesmo pelas costas o abraço: da janela insone sou a chuva na madrugada.
É tudo o que tenho e me valho não ter outra opção.
Aponto adiante, passos de esperança como o dia que teima amanhecer.
Se não tem jeito, está feito, sou o que ficou de quem partiu entre estrelas, olhares, errâncias, entre lapsos e lembranças, coisas que esqueci e não,
Voo colhendo sonhos nos galhos da vida.

VOLTANDO ÀS RAÍZES PRA RECOMEÇAR DO ZERO DE NOVO! – Lá vou eu fazendo o caminho de volta, como se fosse raiz que a semente gorou no meio do dia feito de escuro no inverno. Sigo em frente, mesmo que não saiba se chego ou parto, sei que ardo como quem sucumbe à febre eterna de amar. Lá vou eu beira de rio, vida de mato, a reaprender do amargo no canavial, lições pra quem tanto fez e não deu nada: murros n’água, subindo ladeira pra lugar algum, a seguir o dedo sem direção na itinerância de quem perdeu o chão e vai ao vento ao sabor da correnteza, como a aprender com as estrelas de céu algum, a renascer nas esquinas exorcizando sonhos de olhos abertos e a inventar a vida às mãos vazias. Sigo rédeas soltas, tez afoita rente à vida, moita adentro lida louca, alma outra, só relento. Sigo no peito e na raça, no meio da sorte ou de outra desgraça que vem sem aviso e a remoer, como se isso valesse entender. Lá vou eu topando breu enquanto o dia é outra agonia que à noite imensa é só revelia. Lá vou eu com o que é meu pelas mesquinharias que sacodem pra fora do lance, pelas patifarias que golpeiam destinos pra aumentar no peito a rebeldia. Lá vou eu noutras voltas, cheio de nó pelas costas, pro que der ou vier, por bem ou por malmequer, pelas raias dos ventos e haja o que houver até que a vida se esvaia na navalha do tempo. Vou ali volto já. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

 Imagem: Between War and Dream, do pintor, artista gráfico, ilustrador e escultor eslovaco Vincent Hložník (1919-1997).

Veja mais sobre:
Maceió – Alagoas aqui & aqui.

E mais:
Ana Lins, a Revolução de 1817 & Todo dia é dia da mulher aqui.
Penedo, às margens do São Francisco, Pequena história da formação social brasileira de Manoel Maurício de Albuquerque, As velhas de Adonias Filho, A arte maldita de Georges Bataille, a fotografia de Karin van der Broocke, a pintura de Jaroslav Zamazal, a arte de Marcel Duchamp, a música de Bach & Rachel Podge, Kéfera Buchmann & Vanguard aqui.
Ela, marés de sizígia, Mulher de Yone Giannetti Fonseca, Pensamento crítico & poder da lógica, Tratado da argumentação, a coreografia de Derek Van Barham, a música de Guilherme Arantes, a pintura de Tom Pks Malucelli & Motehr Earth, a arte de James Halperin & Luciah Lopez aqui.
As olimpíadas do Big Shit Bôbras, Os dragões do éden de Carl Sagan, Discurso da difamação de Affonso Ávila, a música de Peter Machajdik, Microbiologia dos alimentos, a pintura de Brian Keeler, a arte de Gray Artus & a Casa do Contador de Histórias aqui.
Só a poesia torna a vida suportável, Vanguarda nordestina de Anchieta Fernandes, Estado de choque de Walmir Ayala, Vanguarda e subdesenvolvimento de Ferreira Gullar, a música de Ira Losco, o cinema de Anna Muylaert, a pintura de Károly Lotz, a arte de Jean Dubuffet & Michael Mapes aqui.
Zine Nascente, A estrutura da consciência de John R. Searle, Não verás país nenhum de Ignácio de Loyola Brandão, a poesia de Antonio Machado, A bicicleta do condenado de Fernando Arrabal, a música de Bob Dylan & Paula Marelembaum, o cinema de Emir Kusturica & Nataša Tapušković, a arte de Lil Dagover & muito mais aqui.
Linguagem & discriminação de Maurizio Gnerre, a música de John Cage & Joshua Pierce, A morte da porta estandarte de Aníbal Machado, a poesia de Mário Quintana, Chaves da estética de Étienne Souriau, o cinema de Bernardo Bertolucci & Eva Green, a pintura de Eliseu Visconti & a Tríplice Deusa Inca aqui.
Zine Nascente, O que faz o Brasil de Roberto DaMatta, A democracia na América de Alexis de Tocqueville, A ilha dos gatos pingados de José J. Veiga, a música de Moacir Santos, a poesia de Joaquim Cardozo, O comediante desencarnado de Louis Jouvet, o cinema de Bahman Ghobadi, a pintura de Vilma Caccuri & Brincarte do Nitolino aqui.
Retorno da deusa de Edward Christopher Whitmont, Uma teofania moderna & muito mais aqui.
Zine Nascente, A filosofia do futuro de Ludwig Feuerbach, Freud & a mulher de Mario Jorge Pereira Reis, a música de Chausson & Sandrine Piau, Dicionário da cachaça de Mário Souto Maior, Paradoxo sobre o comediante de Denis Diderot, Erotique & Claudia Ohana, a pintura de Marcel Duchamp & a arte de Luis Fernando Veríssimo aqui.
Carl Gustav Jung, Ariano Suassuna & muito mais aqui.
Psicopatologia & semiologia: sensação, percepção & consciência, Música no fim de tarde aqui.
Padre Bidião & o Papa Chico aqui.
Desprevenida do golpe do amor aqui.
Sarah Menezes, Efetividade da norma jurídica, As tecnologias na educação, Psicologia e fenomenologia, Direito ambiental e sustentabilidade aqui.
Poemas de Enheduana, A metafísica trilógica de Norberto R. Keppe, Meio Ambiente na Escola, Direito Empresarial & Psicólogo Brasileiro aqui.
A mulher, o movimento sufragista & o feminismo, Gal Monteiro & Vida de Artista aqui.
A mulher da renascença ao marxismo & a pintura de Sandro Botticelli aqui.
Psicologia escolar, Túmulo & capela de Enildo Marinho Guedes, a escultura de Joséphin Peladan, Fecamepa & Tataritaritatá na Rádio Difusora aqui.
Literatura de cordel: Brasí caboco de Zé da Luz & O harém de Eugene Reunier aqui.
A arte musical de Syla Syeg aqui.
O romance e o romantismo, a pintura de José Maria de Medeiros & a arte de Vladimir Kirov aqui.
Processo civilizador de Norbert Elias, O caminho dos sonhos de Marie-Louise von Franz, a música de Saint-Saens & Denise Duval, Simon Bolívar, Soneto de Lope de Vega, Salomé de Oscar Wilde, o cinema de Carlos Saura & Sarah Bernhardt, a pintura de Ernst Hochschartner & Janet Agnes Cumbrae Stewart aqui.
Com quantos desaforos se faz uma eleição, a pintura de Howard Chandler & a arte de Luciah Lopez aqui.
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RÁDIO TATARITARITATÁ: 24 HORAS NO AR!!!
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PRINCÍPIO DO PRAZER DE LUCIAH LOPEZ
Quando eu fui poesia
naveguei no jardim de anêmonas
cavalguei cavalos marinhos
me vesti de rendas de espuma
enfeitei os cabelos com conchas e corais
Quando eu fui poesia
vi o sol e a lua sobre o mar
contei estrelas no céu___colhi estrelas no mar
Quando eu fui poesia
corri léguas marinhas, profundezas abissais
tormentas, vastidões de silêncio e luz
(me fiz grande e me descobri pequena)
Quando eu fui poesia
entendi o segredo da concha vazia
o poderio e a glória de navegar
o mundo submerso.
Princípio do prazer, poema/arte da poeta, artista visual e blogueira Luciah Lopez.
 

quinta-feira, julho 27, 2017

OBJETOS DE BAUDRILLARD, INGEBORG BACHMANN, CARL ORFF, CHLOË HANSLIP, NELSON FREIRE, MITSUKO UCHIDA, DOROTHY IANNONE & NITOLINO!

NITOLINO NO REINO ENCANTADO DE TODAS AS COISAS - A ideia de criação do personagem Nitolino surgiu com o convite feito pela professora e coordenadora pedagógica, Ceiça Mota, da Escola Estadual Josefa Conceição da Costa, bairro de Canaã, Maceió, para recreações com contação de história em turmas de educação infantil. O que era para ser um único momento findou em contínuas apresentações tanto para alunos da educação infantil até as quartas séries do Ensino Fundamental, com as histórias dos meus livros para crianças, como também para estudantes das demais series do Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA), para os quais desenvolvi atividades com literatura de cordel, tudo enquadrado ao meu projeto Brincarte nas Escolas. Assim foi ao longo de todo mês de julho em 2008, finalizando com o lançamento dos meus livros infantis Turma do Brincarte e Frevo Brincarte, e do cordel Tataritaritatá, com exposição dos meus outros livros publicados, palestras, contação e cantação de histórias. Depois disso, como eu estava recebendo inúmeros convites dos mais diversos educandários, tanto da rede pública como da rede privada de Alagoas e de outros estados, o personagem foi tomando corpo e, já no mês de agosto do mesmo ano, o Nitolino já se apresentava em colégios, associações de moradores, centros recreativos e de saúde, bem como nos mais diversos auditórios das mais variadas instituições sociais, fato que levou a criação do evento Natal do Nitolino, com o objetivo de levar livros, contação de história e promover o hábito da leitura entre crianças das áreas periféricas das cidades, bem como da participação em eventos nas Bienais do Livro, Convenções, Congressos, Palestras e em mesas de debates, fato este que levou durante os anos de 2009, 2010 e 2011, à realização de temporadas do espetáculo Nitolino no Reino Encantado de Todas as Coisas, no Teatro Linda Mascarenhas, em Maceió, concomitante ao lançamento do livro homônimo e da segunda edição do livro infantil O lobisomem zonzo, culminando com a gravação do DVD com o resultado dos espetáculos destinados aos alunos da rede pública de ensino e, posteriormente, abertos para o público em geral. Além do mais, Nitolino nada mais é que a minha eterna maneira de ser menino com a perspectiva de que ser criança é pra brincar e ser feliz; com a esperança de que este possa ser um mundo no qual as pessoas possam construir relações saudáveis respeitando uns aos outros, cuidando do planeta e reconhecendo o outro como extensão afetiva de si e de toda irmandade humana; enfim, a minha crença de que o Brasil possa ser um país melhor, mais justo e solidário, porque todo dia é dia de ser criança. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

OS OBJETOS DE BAUDRILLARD
[...] hoje os objetos tornaram-se mais complexos que o comportamento do homem a eles relativo [...] Somos continuamente remetidos, por meio do discurso psicológico sobre o objeto, a um nível mais coerente, sem relação com o discurso individual ou coletivo, e que seria aquele de uma língua dos objetos [...] O homem é reduzido à incoerência pela coerência de sua projeção estrutural. Em face do objeto funcional o homem torna-se disfuncional, irracional e subjetivo, uma forma vazia e aberta então aos mitos funcionais, às projeções fantasmagóricas ligadas a esta estupefaciente eficiência do mundo [...] É da frustrada exigência por totalidade residente no fundo do projeto que surge o processo sistemático e indefinido do consumo. Os objetos/signos na sua idealidade equivalem-se e podem se multiplicar ao infinito: devem fazê-lo para preencher a todo instante uma realidade ausente. Finalmente é porque se funda sobre uma ausência que o consumo vem a ser irreprimível.
Trechos extraídos da obra O Sistema dos Objetos (Perspectiva, 2008), do sociólogo e filósofo francês Jean Baudrillard (1929-2007), defendendo que: Sou um dissidente da verdade. Não creio na ideia de discurso de verdade, de uma realidade única e inquestionável. Desenvolvo uma teoria irônica que tem por fim formular hipóteses. Estas podem ajudar a revelar aspectos impensáveis. Procuro refletir por caminhos oblíquos. Lanço mão de fragmentos, não de textos unificados por uma lógica rigorosa. Nesse raciocínio, o paradoxo é mais importante que o discurso linear. Para simplificar, examino a vida que acontece no momento, como um fotógrafo. Veja mais aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.

Veja mais sobre:
O amor de Naipi & Tarobá, Arte e percepção visual de Rudolf Arnheim, Eles eram muitos cavalos de Luiz Ruffato, Improvisação para o teatro de Viola Spolin, a música de Vivaldi & Max Richter, a fotografia de Fernand Fonssagrives, a coreografia de Regina Kotaka, a pintura de Fernand Léger & a arte de Eugénia Silva aqui.

E mais:
Nitolino na Escola Estadual Josefa Conceição da Costa aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
Duofel, três por um, A sociedade do consumo de Jean Baudrillard, Histórias extraordinárias de Edgar Allan Poe, Tristão & Isolda de Richard Wagner, a coreografia da arte de Pina Bausch, o cinema de Roger Vadim, a pintura de Alice Kaub-Casalonga & Vicente do Rego Monteiro, a arte de Miles Williams Mathis, Amores impossíveis, Poetas de Palmares & Jayme Griz aqui.
Passando a limpo, O mundo líquido de Zygmunt Bauman & muito mais aqui.
A cidade, a urbanização e as enchentes & a arte de Márcia Spézia aqui.
Reino dos sonhos, a literatura de Osman Lins, a poesia de Denise Levertov, A palavra na democracia e na psicanálise de música de Renato Borghetti, a fotografia de Laszlo Moholy-Nagy, a arte de Mike Todd aqui.
Padre Bidião, extraterrestres & novo messias, a pintura de Gino Severini & Liu Yuanshou aqui.
Aquele torneio de chimbra & a pintura de Almada Negreiros aqui.
Uma lembrança perdida no horizonte, a pintura de Inês Dourado & Mary Qian aqui.
Faça seu TCC sem Traumas: livro, curso & consultas aqui.
Livros Infantis do Nitolino aqui.
&
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A PERDA DE INGEBORG BACHMANN
Usámos a dois: estações do ano, livros e uma música.
As chaves, as taças de chá, o cesto do pão, lençóis de linho e uma
cama.
Um enxoval de palavras, de gestos, trazidos, utilizados,
gastos.
Cumprimos o regulamento de um prédio. Dissemos. Fizemos.
E estendemos sempre a mão.
Apaixonei-me por Invernos, por um septeto vienense e por
Verões.
Por mapas, por um ninho de montanha, uma praia e uma
cama.
Ritualizei datas, declarei promessas irrevogáveis,
idolatrei o indefinido e senti devoção perante um nada,
(- o jornal dobrado, a cinza fria, o papel com um aponta-
mento)
sem temores religiosos, pois a igreja era esta cama.
De olhar o mar nasceu a minha pintura inesgotável.
Da varanda podia saudar os povos, meus vizinhos.
Ao fogo da lareira, em segurança, o meu cabelo tinha a sua cor
mais intensa.
A campainha da porta era o alarme da minha alegria.
Não te perdi a ti,
perdi o mundo
.
Poema Uma espécie de perda, extraído da obra O tempo aprazado (Últimos poemas 1957-1967 - Assírio & Alvim, 1992), da poeta e filósofa austríaca Ingeborg Bachmann (1926-1973).

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje é dia de especiais com o compositor alemão Carl Orff e a sua cantata Carmina Burana & Streetsong; a violinista britânica Chloë Hanslip interpretando Mozart, Cinema Paradiso de Ennio Morricone & Fantasy de Franz Waxman; o pianista Nelson Freire interpretando obras de Villa-Lobos & Debussy In Recital; e da pianista e maestro japonesa Mitsuko Uchida interpretando estudo de Debussy & concerto de Beethoven. Para conferir é só ligar o som e curtir.

A ARTE DOROTHY IANNONE
A arte da artista visual alemã Dorothy Iannone.
 

quarta-feira, julho 26, 2017

ARQUÉTIPOS DE JUNG, MOACIR SANTOS, CONTRAPONTO DE HUXLEY, JACOB DE HAAN, MAWACA, ÉRICA GARCIA, JENNY SAVILLE & MARIE JOHNSON HARRISON

OS AVÓS SÓ BOTAM A PERDER – Imagem: Art by Marie Johnson Harrison - Vivi momentos felizes de muitas aventuras na minha infância com os meus avós. O primeiro neto que apareceu no meio de uma penca de tios e tias, pronto, virava eu o xodó e o centro das atenções, manhando dengoso no meio da maior plateia, isso no de menos. Na garupa do cavalo, meu avô Arlindo me levou por vales, rios e canaviais. Quando não, por ser o administrador de engenhos de cana de açúcar do Rio Grande Norte até terras no sul de Minas Gerais, eu podia gabola beiçudo impressionar os matutos com minhas invencionices e trelas de menino tagarela, tudo abestalhado com o meu poder de inventar pinóias cada uma pior que a outra: esse menino bebeu água de chocalho. Essa e muitas outras aventuras nos engenhos só paravam de mesmo quando meu avô ia pra casa dele em Água Preta, eram dias de reinação na bodega sortida de vó Benita, coisa de levar carão o dia todo e esperar pelos acalantos e histórias de trancoso que ela mandava ver pra me amedrontar arrepiado embaixo do cobertor. Os acalantos e histórias dela era coisa de ciúmes nos cabarés, soldados que se perderam, mães que se vingaram, mortes e brigas de famílias, afora coisas do outro mundo e presepadas de espíritos zombeteiros. Quando eu não tremia de medo, morria de rir, e ela mais ainda, até se esquecia das horas contando cada coisa. Findavam as férias e eu de volta pra casa, eram os tempos de ganhador aberto: Pai Lula mesmo todo dia trazia um Mané Gostoso, uma peteca, ioiô, cavalo de pau, boneco de barro, brinquedos de plásticos, doces, biscoitos, confeitos e guloseimas regionais, afora me atiçar com piadas e adivinhações que me premiavam independente de que eu acertasse ou não. Ganhava de todo jeito. Às vezes me levava pra casa dele e lá eu virava artista de cinema com Carma que me recepcionava com o sorriso mais lindo do universo. Depois eu puxava conversa e parava todo movimento da casa, Carma atenta às minhas leseiras, me tratando como um homenzinho que mais queria aparecer que crescer. Oxe, eu ficava contando coisas engraçadas só pra ver a risada de Carma, quando não me ressentia pra ela da minha mãe que não deixava eu brincar no quintal com minha irmã nem com meus primos, me amarrava no pé da mesa, não podia botar o pé descalço no chão, nem chacoalhando na água, nem atrepar no pé de fruta, nem no muro, nem por cima do quintal do vizinho, nem comer chocolate, vixe, ela não deixa, Carma, não deixa! E Carma ria me abraçando e me oferecendo doces e bolos os tantos. O melhor de tudo de todos os meus aprontamentos com meus avós, era que quanto mais eu folgava nas peraltices, mais eles me davam corda para mandar ver nas presepadas. Pois é, os avós botam mesmo tudo a perder, como eu que sou perdido de não prestar mais. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

OS ARQUÉTIPOS E O INCONSCIENTE DE JUNG
[...] Uma existência psíquica só pode ser reconhecida pela presença de conteúdos capazes de serem conscientizados. Só podemos falar, portanto, de um inconsciente na medida em que comprovarmos os seus conteúdos. Os conteúdos do inconsciente pessoal são principalmente os complexos de tonalidade emocional, que constituem a intimidade pessoal da vida anímica. Os conteúdos do inconsciente coletivo, por outro lado, são chamados arquétipos. [...] Estou convencido de que o depauperamento crescente dos símbolos tem um sentido. O desenvolvimento dos símbolos tem uma conseqüência interior. Tudo aquilo sobre o que nada pensávamos e a que, portanto, faltava uma conexão adequada com a consciência em desenvolvimento, foi perdido. Tentar cobrir a nudez com suntuosas vestes orientais, tal como fazem os teósofos, seria cometer uma infídelidade para com a nossa história. Não caímos no estado de mendicância para depois posar como um rei indiano de teatro. Mais vale, na minha opinião, reconhecer abertamente nossa pobreza espiritual pela falta de símbolos, do que fingir possuir algo, de que decididamente não somos os herdeiros legítimos. Certamente somos os herdeiros de direito da simbólica cristã, mas de algum modo desperdiçamos essa herança. Deixamos cair em ruínas a casa construída por nosso pai, e agora tentamos invadir palácios orientais que nossos pais jamais conheceram. Aquele que perdeu os símbolos históricos e não pode contentar-se com um substitutivo, encontra-se hoje em situação difícil; diante dele o nada bocejante, do qual ele se aparta atemorizado. Pior ainda: o vácuo é preenchido com absurdas idéias político-sociais e todas elas se caracterizam por sua desolação espiritual. Mas quem não consegue conviver com esses pedantismos doutrinários vê-se forçado a recorrer seriamente à sua confiança em Deus. Embora em geral se constate que o medo é ainda mais convincente. Tal medo decerto não é injustificado, pois onde o perigo é maior, Deus parece aproximar-se. É perigoso confessar a própria pobreza espiritual, pois o pobre cobiça e quem cobiça atrai fatalidade. Um drástico provérbio suíço diz: "Por detrás de cada rico há um demônio e atrás de cada pobre, dois". Da mesma forma que os votos de pobreza material, no cristianismo, afastavam a mente dos bens do mundo, a pobreza espiritual renuncia às falsas riquezas do espírito, a fim de fugir não só dos míseros resquícios de um grande passado, a "Igreja" protestante, mas também de todas as seduções do perfume exótico, a fim de voltar a si mesma, onde à fria luz da consciência, a desolação do mundo se expande até as estrelas. Já herdamos essa pobreza de nossos pais. [...] Nosso intelecto realizou tremendas proezas enquanto desmoronava nossa morada espiritual. Estamos profundamente convencidos de que apesar dos mais modernos e potentes telescópios refletores construídos nos Estados Unidos, não descobrirem nenhum empíreo nas mais longínquas nebulosas; sabemos também que o nosso olhar errará desesperadamente através do vazio mortal dos espaços incomensuráveis. As coisas não melhoram quando a física matemática nos revela o mundo do infinitamente pequeno. Finalmente, desenterramos a sabedoria de todos os tempos e povos, descobrindo que tudo o que há de mais caro e precioso já foi dito na mais bela linguagem. Estendemos as mãos como crianças ávidas e, ao apanhá-lo, pensamos possuí-lo. [...].
Trechos extraídos da obra Os arquétipos e o inconsciente coletivo (Vozes, 2000), do psicoterapeuta suíço Carl Gustav Jung (1875-1961), trazendo fundamentações teóricas que descrevem arquétipos específicos num estudo sobre as relações deles com o processo de individualização e da psicoterapêutica. Veja mais aqui & aqui.

Veja mais sobre:
Do raiar do dia aos naufrágios crepusculares, Sempre poesia de Helena Kolody, História dos hebreus de Flavio Josefo, Metafísica do real & virtual de Michael R. Heim, Yanomâmi de Milton Nascimento & Fernando Brant, a fotografia de André Brito, a pintura de George Grosz & Fernando Rosa, a arte de Rollandry Silvério & a poesia de Carla Torrini aqui.

E mais:
Os avós aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui & aqui.
Envelhecer não é o fim do mundo aqui.
Alter ego, Arquétipo de criança de Carl Jung, Eminência parda de Aldous Huxley, A flauta roubada de Cassiano Ricardo, a literatura de George Bernand Shaw, Laranja Mecânica, o cinema de Stanley Kubrik, a música de Gilson Peranzzetta & Mauro Senise, a pintura de Jean Baptiste Camille Corot & Demócrito Borges, Brincarte do Nitolino & Rachel Lucena Colégio Fator aqui.
Terceira idade & envelhecimento, Aldous Huxley, a música de Armando José Fernandes, a pintura de Camille Corot, a poesia de Ivaldo Gomes & o blog de Mônica e Monique Justino aqui.
A mútua colheita do amor aqui.
Vade-mécum: enquirídio, um preâmbulo para o amor aqui.
Por onde é que anda o Doro, hem?, Teatro & ciência de Bertolt Brecht, Ziraldo, Revolução de Florestan Fernandes, Canto primeiro de Basílio da Gama, a música infantil de Adriana Calcanhoto, Olga Benário Prestes, Rainha Margot & Isabelle Adjani, Clube Literário de Andrelândia, a pintura de Cristoforo Munari, a arte de Rollandry Silvério & Brincarte do Nitolino aqui.
Segura o jipe!, a prima da Vera & a pintura de Pedro Cabral aqui.
De heróis, mitos & o escambau, a pintura de Alphonse Eugène Felix Lecadre & Aldemir Martins aqui.
Todo dia, a primeira vez, a arte de Gilvan Samico & a pintura de Paul Mathiopoulos aqui.
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CONTRAPONTO DE HUXLEY
[...] Era sempre demasiado fácil para ele dispensar os outros. Gostava muito de se fechar no fundo de seu próprio silêncio. Mas podia ter aprendido a se exteriorizar mais, se não sobreviesse aquele horrível acidente. [...] - Eu quisera que Phillip tivesse ido à guerra. Não por motivos belicosos ou patrióticos. Mas porque se me pudessem garantir que ele não morreria nem ficaria mutilado, teria sido tão bom para ele […] Podia ter-lhe quebrado a concha, podia tê-lo libertado de sua própria prisão. Liberdade sob o ponto de vista emocional, porque o seu intelecto já é bastante livre. [...] Duma maneira abstrata sabes que a música existe, e que é bela; mas não partas daí para fingir, ao escutar Mozart, que estás num arrebatamento que não sentes. Se procedes assim, transformas-te num desses esnobes musicais idiotas que se encontram na casa de Lady Edward Tantamount. Incapazes de distinguir Bach de Wagner, babando-se de êxtase quando os violinos se fazem ouvir. O mesmo se passa exatamente com Deus. O mundo está cheio de esnobes religiosos perfeitamente ridículos. Pessoas que não estão verdadeiramente vivas, que nunca praticaram um ato verdadeiramente vital, que não têm relação viva com coisa alguma; criaturas que não têm o menor conhecimento pessoal ou prático do que é Deus. Mas andam pelas igrejas, rosnam suas orações, pervertem e destroem a totalidade de sua existência sem brilho, agindo de acordo com a vontade duma abstração arbitrariamente imaginada a que resolveram dar o nome de Deus. [...] Tudo será incrível, se pudermos tirar a crosta de banalidade evidente que os nossos hábitos põem nas coisas. Todo objeto, todo acontecimento contêm em si uma infinidade de profundezas dentro de outras profundezas [...]
Trechos extraídos da obra Contraponto (Globo, 2014), do escritor inglês Aldous Huxley (1894-1963). Veja mais aqui, aqui & aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje é dia de especiais com o saudoso arranjador, maestro, compositor e multi-instrumentista Moacir Santos (1926-2006): Ouro negro & Coisas; com a multifacetada cantora, guitarrista, compositora, atriz & performer argentina Érica Garcia: Amorama & El Cerebro; do compositor holandês Jacob de Haan: Concerto d’ Amore, Ross Roy, Utopia & Pacifi Dream; e do grupo vocal e instrumental de pesquisa e recriação muscial Mawaca: Canto da Floresta & Gayatri Mantra. Para conferir é só ligar o som e curtir.

A ARTE DE JENNY SAVILLE
A arte da pintora britânica Jenny Saville. Veja mais aqui.

terça-feira, julho 25, 2017

MANOEL DE BARROS, TONINHO HORTA, BADI ASSAD, GIANNOTTI, MAX RICHTER, GROMAIRE & CHARLOTTE GAINSBOURG

RENASCER NA MANHÃ - Imagem: Intérieur au pot gris, do pintor francês Marcel Gromaire (1892-1971). - Um pé na frente, outro atrás. Um passo após outro, estradas que me perco trocando pernas riso solto olho ao longe. Ali, lá longe a barra da bonança enquanto chuva torrencial desmorona meu pranto por atoleiros, pântanos, desfigurando a fantasia, o futuro e tudo do que fui nem resta mais nada. Você não sabe como as coisas acontecem, apenas acontecem, reação de ação. De repente tudo muda, antes tarde ensolarada, noites de tempestades. Tantas vezes morri, renasci das cinzas, juntando restos, cacos, quase nem sobrevivi, dos pedaços histórias pra contar, coisas de doer, quando dói sai bonito, a dor emancipa. Fui pra longe de mim mesmo, quase nem me reconheci, terra que nasci, vida que plantei, frutos que caíram podres antes de amadurecer. Passei à toa, quanse nem senti o que sangrou, talhos que nem sei, feridas abertas escondidas. Quase nem sonho, o concreto bruto do asfalto entrou rasgando minha cabeça, arrebentando tudo, ideias, ideais, sonhos, quase viro viga parede sem reboco, desbocada, desbotada, piso que afundou, telhado que caiu e só pude ver o Sol sentir e renascer na manhã. © Luiz Alberto Machado. Direitos reservados. Veja mais aqui.

A UNIVERSIDADE DE GIANNOTTI
Foi-se o mundo de antigamente. A revolução tecnológica alterou por completo nossas relações com a natureza e com o outro. Vivemos mergulhados numa segunda natureza constituída de máquinas sábias, verdadeiros raciocínios ambulantes dos quais pegamos o começo e o fim. O protótipo da máquina moderna, o computador, não tem nada a ver com a ferramenta, que prolonga o gesto e poupa esforços; consiste na encarnação duma teoria, saber feito material volátil, que por si só a verifica e abre um espaço inédito que o conhecimento do indivíduo nunca poderia desenhar. O computador é um cientista coletivo posto à disposição do pesquisador ou da dona-de-casa. Por isso reúne, no seu pequeno intervalo, a teoria e a prática, sendo o exemplo mais extraordinário de como a ciência neste século se transformou numa força produtiva. Se, na verdade, pode ser objeto de consumo individual, jogo de salão moderno, é quando se integra numa fábrica ou numa instituição prestadora de serviços que cumpre seu destino social. Mas nem só de computador vive o homem moderno. O telefone, a televisão, o processador de palavras, o avião ultrarápido são peças de sistemas diante dos quais cada um se põe isoladamente, fascinado pela máquina como se ela fosse uma tela de cinema que, no escuro, abole o pensamento próprio. Nada mais próximo do que a voz que fala do outro lado da linha, ouvimo-la como se estivesse ao lado. Enquanto porém o outro visível foge de nosso arbítrio e resiste a nossos caprichos, a voz alheia no aparelho depende duma ligação desejada e está sempre à mercê daquela ira que bate um telefone na cara. Desse modo, a confissão mais íntima vive sob a ameaça dum corte abrupto, que empresta à individualidade contemporânea o caráter duma mônada sem janelas. A ilusão narcísica é contraparte da cientificação da natureza. [...] A Universidade é coisa perigosa em países subdesenvolvidos. Só o fato de possuir hoje mais de 1.600.000 estudantes dá uma idéia da revolução intelectual que haveria se a maioria deles fosse eficaz e inventiva. Daí a funcionalidade da infra-estrutura precária e da incompetência. [...] Não se trata de separar uma Universidade que o Estado organiza como uma comunidade de sábios, de outra que se identifique com uma empresa capitalista. Nem uma nem outra são viáveis em sua pureza. A questão crucial é saber como se vai controlar a relação da Universidade com a comunidade e quem vai desempenhar essa função. O departamento estatal isonômico pode converter-se num ninho de burocratas, aquele intimamente ligado ao Governo ou à empresa privada, num inferno competitivo. O primeiro perigo a evitar é que ambos se julguem a si mesmos. Só me parece sair do impasse se a Universidade aprofundar seu processo de democratização, obviamente evitando o assembleísmo dum lado, e a farsa parlamentar de outro. Criar um sistema efetivo e eficaz de representação, eis a tarefa mais urgente. [...] No imaginário das sociedades ocidentais reside o impulso para o conhecimento racional. Por isso, estamos mal acomodados neste conhecer que se resolve num fazer de conta de conhecimento. [...].
Trechos extraídos de A universidade e a crise (Novos Estudos, 1984), do filósofo e professor universitário José Arthur Giannotti.
Autor de A universidade em ritmo de barbárie (Brasiliense, 1986), entre outras obras.

Veja mais sobre:
Palco da vida, A terceira mulher de Gilles Lipovetsky, Toda palavra de Viviane Mosé, A vida mística de Jesus de Harvey Spencer Lewis, a música de Andersen Viana, Roseli Rodrigues & Balé Teatro Guaíra, a pintura de Maria Szantho & Katia Kimieck, a arte de Maxime des Touches & Vavá Diehl aqui.

E mais:
O dia fora do tempo, Vida pra o consumo de Zygmunt Bauman, Salambô de Gustave Flaubert, Hino à beleza de Charles Baudelaire, Lisístrata de Aristófanes, a música de Jean-Philippe Rameau, Valeria Messalina, a arte de Alan Moore, a pintura de Anita Malfatti & Jaroslav Zamazal aqui.
Auto-de-fé de Elias Canetti, a música de Alfredo Casella & Celia Mara, Gestão de Pessoas, a arte de Paula Valéria de Andrade & Lou Albergária aqui.
O ser humano e seus papéis construtivos e não-construtivos aqui.
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Dhammapada de Acharya Buddhrakkhita, Natureza humana de Abraham Maslow, Educação de José Carlos Libâneo, Responsabilidade civil da propriedade, a arte de Kristina Laurendi Haven aqui.
Cadê o padre Bidião?, História da criança e da família de Philippe Ariès, O sol também se levanta de Ernest Hemingway, Espelho convexo de Celina Ferreira, O teatro e o seu duplo de Antonin Artaud, a música de Catherine Malfitano & Mawaca, o cinema de pintura de Emil Orlik & Miles Mathis, Programa Tataritaritatá & muito mais aqui.
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SABIÁ COM TREVAS DE MANOEL DE BARROS
Me abandonaram sobre as pedras infinitamente nu, 
e meu canto.
Meu canto reboja.
Não tem margens a palavra.
Sapo é nuvem neste invento.
Minha voz é úmida como restos de comida.
A hera veste meus princípios e meus óculos.
Só sei por emanações por aderência por incrustações.
O que sou de parede os caramujos sagram.
A uma pedrada de mim é o limbo.
Nos monturos do poema os urubus me farreiam.
Estrela é que é meu penacho!
Sou fuga para flauta e pedra doce.
A poesia me desbrava.
Com águas me alinhavo
.
Sabiá com trevas, poema extraído obra Arranjos para assobio (Companhia das Letras, 2016), do poeta Manoel de Barros (1916-2014). Veja mais aqui, aqui & aqui.

RÁDIO TATARITARITATÁ:
Hoje é dia de especiais com o compositor, arranjador, produtor musical e guitarrista Toninho Horta; a cantora, violonistak, compositora e percussionista Badi Assad; o compositor alemão Max Richter; e a cantora e atriz franco-inglesa Charlotte Gainsbourg. Para conferir é só ligar o som e curtir.

A ARTE DE GROMAIRE
A arte do pintor francês Marcel Gromaire (1892-1971).